Espíritas na Política
É por demais conhecida a resistência dos espíritas em tratar de questões
políticas dentro ou fora dos centros. A política, em virtude de Ter se convertido
em campo fértil para a ação de aproveitadores e espertalhões de todo tipo, passou
a causar desinteresse por parte daqueles que por uma razão ou outra não concordam
com tal estado de coisas, embora na prática, nada façam para mudá-lo.
Há muitos equívocos, ignorância e falso moralismo quando se fala em política.
Confunde-se politiquice, politicagem e politicalha com a arte da política, a ciência
política, voltada para a gestão do interesse coletivo dentro das normas e princípios
éticos extremamente importantes para a vida de relação.
É verdade que a política partidária vai de mal a pior. Com o afastamento
dos grandes estadistas da função pública, por velhice, morte, desinteresse descrença,
etc., o campo fica livre para os corruptos e corruptores que se valem do poder e
prestígio dados pela posição para favorecimentos pessoais, de amigos, empresas,
etc.
No entanto, existem (ainda bem) bons políticos dirigindo os interesses da nação.
São poucos e para aumentar seu número deveríamos passar do estágio da indignação
para o da ação.
Para isso é preciso rever conceitos, concepções e idéias acerca da função pública
e retomá-la como atividade saudável para saneá-la em seus procedimentos e objetivos.
Será que o espírita está impedido de exercer alguma função política?
Não há em lugar algum da codificação alguma referência que descredencie a política
como atividade humana necessária à vida social ou que a apresente como algo que
degrade o ser humano, que o rebaixe de alguma forma. Existem, sim, textos vários
que, se lidos de uma perspectiva política, podem fornecer preciosos subsídios para
aqueles que desejem atuar formal ou informalmente na vida pública. A terceira parte
de O Livro dos Espíritos, por exemplo, que trata das Leis Morais, vários textos
inseridos em Obras Póstumas (como As Aristocracias) e mesmo em O Evangelho Segundo
o Espiritismo.
A verdade é que a vida social exige a convivência política, própria da “polis”,
lugar onde vivem os cidadãos. E o Estado tornou-se uma necessidade, tanto quanto
a estrutura burocrática e os partidos e respectivos representantes, apesar de todas
as merecidas críticas.
Será que o espírita está impedido de exercer alguma função política? Do ponto
de vista doutrinário, certamente não. É uma atividade como outra qualquer,
com seus tropeços e dificuldades, exigindo habilidades e vocação. A rejeição generalizada
da política dentro do movimento espírita deve-se à nossa formação basicamente religiosa
e mística, raiando o pieguismo e, principalmente, a preconceitos totalmente infundados.
Poucos seriam capazes de justificar racionalmente, razoavelmente e doutrinariamente,
porque não participar da política partidária, da defesa dos interesses da nação
e do bem comum. Na verdade, é mais cômodo deixar que outros se ocupem dessas tarefas
estressantes, comprometedoras e de alto risco. Dentro dessa lógica, como melhorar
a vida social, se aqueles que poderiam levar conceitos e parâmetros novos para as
deCisões nas Câmaras de Vereadores ou Assembléias Legislativas, se limitam a fazer
coro com os críticos de plantão?
A Doutrina Espírita tem muito a oferecer para a vida pública através de eventuais
representantes, influenciando na elaboração de novas leis, inibindo a ação de
aproveitadores através de posturas mais éticas, sem concessões perigosas, com discursos
moralizadores (e não falso moralismo), que mostrem que – há alternativas, novas
possibilidades e novos caminhos.
Quem poderia, afinal, tornar-se um candidato às eleições e assumir um cargo de
representatividade na esfera partidária? Qualquer espírita, homem ou mulher, com
boa formação doutrinária, alguma experiência de vida, boa saúde física e emocional,
bom nível de cultura geral, boas idéias e algum carisma, além de facilidade de expressar-se
por escrito ou verbalmente. Convém lembrar que a função política tornou-se uma função
técnica onde só a boa vontade não basta. Uma equipe de apoio, coragem para o exercício
do mandato e, certamente, a Providência Divina não faltará com o restante. Cuidado
especial deve ser tomado na escolha do partido político. Uma escolha errada pode
por tudo a perder já que os partidos representam interesses de parcelas da população,
de grupos sociais e até de setores empresariais. Deve-se buscar o partido que mais
se aproxime, em sua plataforma de trabalho, do ideário espírita. Certamente não
serão os partidos de direita, ligados a setores conservadores e retrógrados das
oligarquias, urbana ou agrária.
O assunto é polêmico sem dúvida, mas merece reflexões por parte daqueles de mente
mais aberta e que já se cansaram de ver as coisas se repetindo. Gente mexendo em
tudo para não mudar nada e a miséria se alastrando como uma praga. Há uma boa bibliografia
espírita para subsidiar as reflexões dos interessados como:
Filosofia Social Espírita (FEB) e O Plano Social de Deus (Edicel), ambos de Ney
Lobo. Espiritismo e Formação Política, de nossa autoria (EME Ed.), Parapsicologia
e Materialismo Histórico de Humberto Mariotti (Edicel), e os textos citados da Codificação,
para mencionar apenas alguns. Espíritas na política sim. Por que não?
REVISTA ESPÍRITA DE CAMPOS – NO. 51 jul/ago/set 99