A transformação íntima só se torna efetiva e verdadeira quando ela é
irradiada para a coletividade em que estamos inseridos. O Espiritismo nos fala
da realidade do espírito e do seu processo evolutivo, ensinando-nos que a
felicidade é uma construção individual e coletiva. Ninguém conseguirá ser feliz
com o seu derredor emitindo gritos de carências e lágrimas de dores. Ninguém
será feliz sozinho ou rodeado de poucos. O IPEPE – Instituto de Intercâmbio do
Pensamento Espírita de Pernambuco, que tem como missão interligar o pensamento
espírita às diversas áreas do conhecimento humano, colaborando para a cidadania
e a paz, estará presente onde o homem estiver para, junto com este, melhorar as
condições espirituais e sociais da humanidade. O trabalho que ora se apresenta
com o título “Um Ensaio sobre Espiritismo e Política” preparado pela CASP –
Coordenadoria da Área Sócio-Política do IPEPE, é um convite aberto para todos
nós espíritas, para que possamos fazer uma reflexão corajosa sobre o nosso atual
estágio de cidadania . A questão não é deixar de fazer algo que esteja sendo
feito, mas sim, analisarmos se não estamos deixando de fazer algo que já
deveríamos estar fazendo. Bom , falar mais já estaria privando o leitor de
iniciar este estudo e reflexão para, sem maiores perda de tempo, iniciarmos as
necessárias ações.
Gezsler Carlos West
Coordenador Geral do IPEPE
A TÍTULO DE REFLEXÃO
Deve o espírita esforçar-se para cumprir os seus deveres de cidadão e exercer
os seus direitos políticos? – A Doutrina Espírita conscientiza a criatura
humana, levando-a a tornar-se um “homem de bem” no sentido global? – Que têm
feito as Instituições Espíritas para favorecer o processo de conscientização
sócio política dos seus freqüentadores? – O que você acha de realizarmos um
ciclo de estudos e debates sobre o assunto desta apostila? – Se Você despertou
maior interesse sobre o assunto, leia esta apostila.
EM TORNO DO CONCEITO DE POLÍTICA
Algumas pessoas, no meio espírita, reagem de maneira negativa e, às vezes,
até assustadas quando se fala em política, demonstrando desinformação e
preconceito. Existe até um tabu de que Política entra em confronto com o zelo
doutrinário. Na realidade a Política é bem mais abrangente e está presente em
tudo que o homem realiza. Todos nós somos políticos. Há mais de 2000 anos o
filósofo grego Aristóteles escreveu que o homem é um “animal político” e não
estava brincando. Estava dizendo uma coisa seriíssima, que permanece válida até
hoje. Política é toda atividade que as pessoas praticam com o objetivo de
influenciar os acontecimentos, o pensamento e sobretudo as decisões da sociedade
em que vivem. No quotidiano confirma-se a natureza política do homem, uma vez
que a vida em comum e as formas de coexistência são ordenadas segundo os
sistemas de governo e, nessas condições, querendo ou não participar, podendo ou
não atuar na vida política, o homem recebe direta ou indiretamente os efeitos
desses sistemas e paga pelas conseqüências. Os líderes religiosos têm forte
papel político. E mesmo nós, cidadãos comuns, fazemos política com muita
freqüência, mesmo não tendo consciência disso. Na feira, quando falamos mal do
governo, ou nas reuniões sociais, quando falamos mal ou bem do partido tal ou do
ministro tal, estamos tentando fazer a cabeça dos outros, que por sua vez
tentarão fazer a de outros. Ou seja, estamos contribuindo para formar a chamada
“opinião pública”. Mesmo se o peso desses atos é pequeno, o fato é que, ao
praticá-los, estamos participando do processo político. O Evangelho apresenta,
igualmente, a mais elevada fórmula de vida político-administrativa aos povos da
Terra: O Reino do Amor. O Espiritismo em seus aspectos científico, filosófico e
religioso tem muito a ver com a compreensão e organização da sociedade, a fim de
que ela seja mais justa e amorosa e, através de seus adeptos, atue na realização
do Reino de Jesus — Reino da Verdade, do Amor e da Justiça — sobre a face da
Terra.
UM ENSAIO SOBRE ESPIRITISMO E POLÍTICA
“Para nós, a política é a ciência de criar o bem de todos e nesse princípio
nos firmaremos”. Deputado Dr. Adolfo Bezerra de Menezes
Reflexão Preliminar
Haverá alguma relação entre Espiritismo e Política? Sobre o aspecto
filosófico, o Espiritismo tem a ver e muito com a Política, já que esta deve ser
a arte de administrar a sociedade de forma justa. Conseqüentemente, o espírita
não pode declinar da sua cidadania e deve vivenciá-la de forma consciente e
responsável. O Brasil sempre foi alvo de muitas esperanças. Falava-se em país do
futuro, em berço da nova civilização e, nos meios espíritas, em “Coração do
Mundo e Pátria do Evangelho.” O grande problema é que os brasileiros nunca
demonstraram grande empenho para alcançar concretamente esses títulos. Boa parte
dos trabalhos de ciência política no Brasil trazem uma característica marcante:
a constatação de que a sociedade brasileira é dependente do Estado e que não tem
apego a valores como democracia, liberdade e igualdade. Não tem tradição de
participação, de reivindicar seus direitos. A sociedade é uma das maiores
responsáveis pelos males que a atingem. Somos um País que não se conscientizou
de que depende da sociedade colaborar na resolução de muitos problemas dos quais
o Estado não consegue dar conta. O Brasil só vai poder dizer-se Pátria do
Evangelho quando der os primeiros passos na construção de uma sociedade
realmente democrática, justa e fraterna. Quando, enfim, os brasileiros olharem
para a sociedade e perceberem que fazem parte dela. Se uma pessoa está sofrendo,
em um determinado local, todos sofremos, pois os problemas dela acabam nos
atingindo de uma maneira ou de outra, seja por meio da violência ou dos
mecanismos econômicos mais complexos. E o que tem a ver o Espiritismo com isso?
O espírita tem em suas mãos instrumentos poderosos de participação (e de
transformação) da sociedade: as federativas, os centros espíritas, as
instituições específicas, os órgãos de comunicação. Podem, no mínimo, auxiliar
na mudança de mentalidade de seus adeptos. Sabemos que Kardec recomendou aos
centros que deixassem de lado as questões políticas. Mas essa afirmação
significa que não devemos trazer para o centro espírita as campanhas e
militâncias partidárias, pois o lugar para o seu exercício é no seio das
agremiações e locais respectivos. Assim, jamais o Espiritismo, como Doutrina, e
o Movimento Espírita, como prática, poderão dar guarida a um partido político em
seu seio, por exemplo: Partido Social Espírita, Partido Espírita Cristão, etc.
As questões políticas decorrem dos próprios princípios do Espiritismo. A partir
do momento em que se fala em reforma moral, em mudança de visão do mundo, em
desapego dos bens materiais, prática da caridade, etc. fala-se sobre política.
Principalmente, quando se fala em transformação da sociedade, como aparece a
todo momento na Codificação (particularmente no capítulo final da Gênese),
estamos falando de política. “Em que consiste a missão dos Espíritos Encarnados?
– Em instruir os homens, em lhes auxiliar o progresso; em lhes melhorar as
instituições, por meios diretos e materiais”. (Questão n º 573 de O Livro dos
Espíritos). De se entender, então, que não pode o espírita alienar-se no seio da
sociedade em que vive, com a desculpa de que Espiritismo e Política não têm nada
que ver, pois é preciso lembrar que a vida material e a vida espiritual são
dimensões contínuas da própria Vida. O homem tem que progredir, e isolado ele
não tem condições disso, já que seu progresso depende dos bens que lhes são
oferecidos pela família, pela escola, pela religião e demais agências sociais.
Para o espírita, essa ação política deve ser sempre inspirada nos princípios
expressos pelo aspecto filosófico do Espiritismo, que o levam a amar e, nesse
caso, amar é desejar o bem; logo, a exteriorização política do Amor é a
expressão do querer bem e do agir para o bem de todos. A ação política dos bons
é um imperativo na hora atual. O Espiritismo apresenta conceitos claros e
precisos para essa atuação. “A nova geração marchará, pois, para a realização de
todas as idéias humanitárias compatíveis com o grau de adiantamento a que houver
chegado. Avançando para o mesmo alvo e realizando seus objetivos, o Espiritismo
se encontrará com ela no mesmo terreno. Aos homens progressistas se deparará nas
idéias espíritas poderosa alavanca e o Espiritismo achará, nos novos homens,
espíritos inteiramente dispostos a acolhê-lo”. (A Gênese). “O Espiritismo não
cria a renovação social; a madureza da humanidade é que fará dessa renovação uma
necessidade. Pelo seu poder moralizador, por suas tendências progressistas, pela
amplitude de suas vistas, pelas generalidades das questões que abrange, o
Espiritismo é mais apto do que qualquer outra doutrina a secundar o movimento de
regeneração; por isso, é ele contemporâneo desse movimento. Surgiu na hora em
que podia ser de utilidade, visto que também para ele os tempos são chegados”.
(A Gênese). O Espiritismo trabalha com a educação. Esta é a base da própria
Doutrina pois, para praticá-la, temos de nos educar. E a educação tem um
conteúdo extremamente político, pois muda nossa forma de ver o mundo e de agir
nele. Assim, é cada vez mais importante que os centros espíritas percebam a
importância de discutir os assuntos da realidade concreta. Não estaremos fazendo
política no aspecto partidário, mas sim auxiliando na conscientização dos
espíritas sobre como entender a sociedade e agir nela de uma forma crítica e
consciente. Com uma visão crítica baseada nos princípios espíritas. Qual o
posicionamento de um espírita frente a questões como violência, menores
abandonados, educação, desemprego, racismo, discriminação social. O que podemos
fazer em nosso âmbito para combater esses problemas? Não adianta querer ser
espírita no plano espiritual. Podemos e devemos estudar a moral espírita em sua
teoria. Mas não há como fugir: a sua aplicação prática será, quer queiramos ou
não, na realidade concreta, enfrentando esses problemas do cotidiano. Segundo J.
Herculano Pires, em O Centro Espírita, “O Espiritismo se liga a todos os campos
das atividades humanas, não para entranhar-se neles, mas para iluminá-los com as
luzes do Espírito. Servir o mundo através de Deus é a sua função e não servir a
Deus através do mundo (…).” Por tudo isso, devemos entender que são
fundamentais o Espiritismo e a Política para a construção de Uma Nova Sociedade.
A Lei de Adoração e a Política
“Tem Deus preferência pelos que o adoram desta ou daquela maneira? – Deus
prefere os que o adoram do fundo do coração, com sinceridade, fazendo o bem e
evitando o mal, aos que julgam honrá-lo com cerimônias que os não tornam
melhores para com os seus semelhantes”. (Questão nº 654 de O Livro dos
Espíritos). Para se fazer o bem e evitar o mal é necessário que o homem seja
participante da sociedade em que vive, através de ações que preservem os
próprios direitos naturais, como, também, dentro de suas possibilidades, defenda
os direitos naturais do seu semelhante. A adoração a Deus, no conceito espírita,
tem uma ação política dentro da sociedade, ou de forma mais ampla, no planeta em
que se vive: fazer o bem e evitar o mal. Para fazer o bem e evitar o mal é
necessário procurar extinguir o orgulho, a inveja, o egoísmo, a vaidade e a
prepotência, não só de si mesmo, como também das instituições e grupos sociais.
Tal conceito de adoração a Deus leva não só à reforma íntima, ou seja, à
auto-educação da pessoa, como à reforma da sociedade em seus padrões de egoísmo
e orgulho, em nome dos quais se justificam as desigualdades e as injustiças.
Conseqüentemente, no conceito de adoração a Deus expresso pelo Espiritismo, há
todo um comprometimento de participação na sociedade, reiteradamente manifestado
pelos espíritos a Allan Kardec. Assim, vemos claramente tal ligação: Deus, Homem
e Sociedade na questão nº 657 de O Livro dos Espíritos. “Têm, perante Deus,
algum mérito os que se consagram à vida contemplativa, uma vez que nenhum mal
fazem e só em Deus pensam? – Não, porquanto, se é certo que não fazem o mal,
também o é que não fazem o bem e são inúteis. Demais, não fazer o bem já é um
mal. Deus quer que o homem pense nele, mas não quer que só nele pense, pois que
lhe impôs deveres a cumprir na terra. Quem passa todo o tempo na meditação e na
contemplação nada faz de meritório aos olhos de Deus, porque vive toda uma vida
pessoal e inútil à humanidade e Deus lhe pedirá contas do bem que não houver
feito”. Da mesma forma, a atitude comodista e passiva, expressa pela omissão
diante dos problemas humanos em estruturas sociais injustas e materialistas é
por Ele reprovada. Pois o comodista ainda que não pratique o mal, dele se
aproveita. Portanto, o espírita para não ser omisso e assim indiretamente
aproveitar-se do mal, deve se esforçar para que o conceito espírita de adoração
a Deus seja efetivamente aplicado na sociedade humana, de forma conveniente,
oportuna e adequada, em consonância com a própria Ética ou Moral Espírita.
A Lei do Trabalho e a Política
“Por trabalho só se devem entender as ocupações materiais? – Não; o Espírito
trabalha, assim como o corpo. Toda ocupação útil é trabalho”. (Questão nº 675 de
O Livro dos Espíritos) A civilização cria multiplicidades de trabalhos; nenhum
deles, porém, poderá servir como meio de exploração do homem com o objetivo do
lucro, nem ferir sua dignidade como ser humano. Quando isso acontece, surge a
pobreza e a marginalização, evidenciando flagrante injustiça social. A Doutrina
Espírita denuncia, de forma veemente, tal situação. Esclarece que, todo aquele
que tem o poder de mandar é responsável pelo excesso de trabalho que imponha aos
que lhe são subordinados, abusando da autoridade e transgredindo as leis de
Deus. É preciso que se reconheça a participação do homem através do trabalho na
sociedade, criando o bem comum, aumentando o patrimônio da grande família
humana. Por isso, dessa sociedade ele deve participar de maneira justa e
criativa, jamais dela podendo ser marginalizado. A sociedade deve ser organizada
de forma a que todos possam trabalhar e os que estão doentes ou impossibilitados
ao labor recebam desta mesma sociedade os meios necessários à sua subsistência
de maneira justa e digna. Não adianta dizer ao homem que ele tem o dever de
trabalhar; é preciso que a sociedade ofereça-lhe a oportunidade do trabalho, o
que nem sempre acontece. A maior preocupação deste final de milênio tem um nome:
desemprego. Num mundo globalizado, cada vez mais dependente da economia e das
variações financeiras, o problema do desemprego está se tornando muito grave. O
Espiritismo valoriza o trabalho como uma ação social e espiritual, pois o homem
dele participa com seu corpo e espírito, não importando seja a atividade chamada
manual ou intelectual. Portanto, nenhum homem, em boas condições físicas e
mentais, pode ser alijado do trabalho. Por isso, o desemprego não é um problema
que será resolvido por uma “lei histórica” ou “divina”. Os homens é que tem de
resolvê-lo. É bom que os espíritas reservem um pouco da sua preocupação para os
debates que se travam no mundo a respeito do desemprego. Precisamos perceber que
quando se trata desta questão, fala-se da evolução do homem.
A Lei de Reprodução e a Política
“Será contrário à lei da Natureza o aperfeiçoamento das raças animais e
vegetais pela Ciência? Seria mais conforme a essa lei deixar que as coisas
seguissem seu curso normal? – Tudo se deve fazer para chegar à perfeição e o
próprio homem é um instrumento de que Deus se serve para atingir seus fins.
Sendo a perfeição a meta para que tende a Natureza, favorecer essa perfeição é
corresponder às vistas de Deus”. (Questão nº 692 de O Livro dos Espíritos). O
homem em sua participação política, ou seja, em sua ação na sociedade, deve agir
para o equilíbrio da própria espécie, como da vida que o circunvolve, pois tudo
ele deve fazer para chegar à perfeição e ele é um instrumento do qual Deus
também se serve. Em sua participação política na sociedade, o espírita não
poderá perder de vista o aspecto ético ou moral da questão. A reprodução no ser
humano está ligada à tutela do casamento, cujo surgimento representa um dos
primeiros progressos da sociedade humana, pois estabelece a solidariedade
fraterna. O espírita, de forma individual, e o Movimento Espírita, de maneira
coletiva, precisam estar atentos à defesa dos fundamentos morais que preservem a
nobre e elevada instituição do casamento. A ação espírita de preservação dos
laços de família não pode ficar limitada às quatro paredes do Centro Espírita,
mas deve ser uma participação na sociedade. Para isso utilizará os meios e
instrumentos lícitos e morais, associando-se a outras instituições e
organizações que tenham o mesmo objetivo. Assim poderá se contrapor à onda
avassalante de sensualidade que varre os órgãos de comunicação, como a
televisão, a revista, o jornal, o cinema, o teatro e que mantêm a mulher apenas
como um objeto sexual, sob a aparência de libertação.
A Lei de Conservação e a Política
“O uso dos bens da Terra é um direito de todos os homens? – Esse direito é
conseqüente da necessidade de viver. Deus não imporia um dever sem dar ao homem
o meio de cumpri-lo”. (Questão nº 711 de O Livro dos Espíritos). No entanto, nas
organizações sociais injustas a maioria dos homens é impedida do uso dos bens da
terra por aqueles que não só usam tais bens como, ainda, os dilapidam no gasto
supérfluo. Não respeitam o limite das necessidades que a Natureza traçou. Todos
os seres vivos possuem o instinto de conservação, qualquer que seja o grau de
inteligência, pois a vida é necessária ao aperfeiçoamento dos seres. Por isso a
Terra produz de modo a proporcionar o necessário aos que a habitam, visto que só
o necessário é útil. O supérfluo nunca o é. (Veja a Questão nº 704 de O Livro
dos Espíritos). Esclarece o Espiritismo que para todos há um lugar ao sol, mas
com a condição de que cada um ocupe o seu lugar e não o dos outros. A Natureza
não pode ser responsável pelos defeitos da organização social, nem pelos efeitos
da ambição e do egoísmo. O uso dos bens da Terra é um direito de todos os
homens. O Espiritismo não justifica aqueles que vivem da exploração do
semelhante, que pretendem os benefícios da civilização só para si. Aponta-lhes a
hipocrisia e a falsidade. O Homem não merece censura por desejar o seu
bem-estar. É natural esse desejo. Ele não é condenável, desde que não seja
conseguido com o prejuízo do outro e não prejudique as forças físicas ou morais.
Todo ser humano tem direito ao bem-estar. Logo, está errada e é injusta a
sociedade em que apenas alguns gozam do bem-estar. Também não está certa para o
Espiritismo a sociedade que elege padrões de felicidade em termos de CONSUMIR
(feliz é quem tem dinheiro para comprar) e não de SER (desenvolvendo sua
capacidade de conhecer e amar), pois apela somente para a satisfação dos
impulsos ou instintos. O espírita deve, mesmo com sacrifício, agir
conscientemente para que, na sociedade humana, todos tenham o necessário para o
seu progresso. Sabendo que o uso dos bens da Terra é um direito de todos os
homens, conforme os postulados do Espiritismo, o espírita deve participar pelos
meios lícitos que tenha ao seu dispor para que esse direito seja indistintamente
aplicado.
A Lei de Destruição e a Política
“Se a regeneração dos seres faz necessária a destruição, por que os cerca a
Natureza de meios de preservação e conservação? – A fim de que a destruição não
se dê antes do tempo. Toda destruição antecipada obsta ao desenvolvimento do
princípio inteligente. Por isso foi que Deus fez que cada ser experimentasse a
necessidade de viver e se reproduzir”. (Questão nº 729 de O Livro dos
Espíritos). Quando a destruição ultrapassa os limites que a necessidade e a
segurança estabelecem, aparece o domínio da materialidade sobre a natureza
espiritual. “Toda destruição que excede os limites da necessidade é uma violação
da lei de Deus”. (Questão nº 735 de O Livro dos Espíritos). Há, pois,
necessidade de o homem organizar a sociedade de forma a ser previdente, somando
conhecimentos e experiências, encontrando a solução dos males ao remover as
causas. Para isso concorrem a ciência e a técnica. No entanto, se flagelos como
inundações, epidemias, secas levam a dor e o sofrimento a grande parte das
populações, é porque o egoísmo, traduzido no privilégio de minorias, impede que
recursos avançados da ciência e da técnica sejam aplicados de forma a eliminar
ou diminuir seus danosos e dolorosos efeitos. Para que haja harmonia numa
sociedade humana é imperioso que a justiça se faça junto a cada um de seus
componentes. Porém, a realidade, atualmente ainda não é essa. Nações mais
desenvolvidas econômica e tecnicamente procuram explorar as nações pobres. Agem
de maneira a mantê-las em permanente dependência econômica, política e até mesmo
militar. A destruição e a violência não se manifestam somente de forma física e
ostensiva; mais terríveis e perigosas elas são quando se manifestam de forma
sutil e disfarçada provocando o aniquilamento e a degradação do meio ambiente em
que o homem vive. Todas as vezes que o espírita constatar a destruição da
natureza em função do lucro que os sistemas econômicos exigem, deverá
associar-se às vozes que clamam contra tal destruição. Para isso dará apoio e
participação ao partido político, aos movimentos ecológicos, às organizações
estudantis e outras que lutam contra a destruição desregrada. Diz a Constituição
do Brasil no artigo 5º: “LXXIII – qualquer cidadão é parte legítima para propor
ação popular que vise anular ato lesivo do patrimônio público (…) ao meio
ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada
má fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência”.
A Lei de Sociedade e a Política
“A vida social está em a Natureza? – Certamente, Deus fez o homem para viver
em sociedade. Não lhe deu inutilmente a palavra e todas as outras faculdades
necessárias à vida de relação”. (Questão nº 766 de O Livro dos Espíritos). A
pessoa tem um compromisso com a sociedade em que vive. Nela deve participar,
dando sua contribuição, de acordo com suas possibilidades intelectuais e
sentimentais. O espírita, pelo conhecimento que tem da Doutrina Social Espírita,
consubstanciada nas Leis Morais de O Livro dos Espíritos, tem o dever de
participar ativa e conscientemente na sociedade em que vive, agindo para que os
princípios expressos em tais leis se efetivem na sociedade humana.
Conseqüentemente, a omissão e a ociosidade que venham a alimentar qualquer tipo
de isolamento social, produzirão sempre a inutilidade, o fanatismo ou o egoísmo
rotulado de pureza ou santidade. O homem tem necessidade de progredir, de
desenvolver suas potencialidades e isso ele só pode fazer vivendo em sociedade e
é necessário que a sociedade esteja estruturada a fim de que todos que a compõem
tenham tal possibilidade. O espírita deve estar atento, à vista dos conceitos
espíritas sobre sexo, família, dignidade humana, para denunciar as ações e
movimentos que subvertam os valores espirituais. Conclui-se, assim, que o homem
não é um ser independente. Pelo contrário, ele depende de seus semelhantes ao
mesmo tempo que é impulsionado ao progresso; por isso impõe-se-lhe a necessidade
de aprender a amar o seu próximo e não explorá-lo física, intelectual e
sentimentalmente. Esse amor deve ser traduzido de forma concreta. Não apenas dar
esmola ao pobre e pedir-lhe paciência, acolher o velho desamparado no asilo,
agasalhar a criança órfã ou abandonada, mas agir para que o AMAI-VOS UNS AOS
OUTROS se efetive através do direito que todo ser humano tem de possuir o
necessário: alimentação, vestuário, casa, saúde, trabalho, lazer e
desenvolvimento espiritual.
A Lei do Progresso e a Política
“A força para progredir, haure-a o homem em si mesmo, ou o progresso é apenas
fruto de um ensinamento? – O homem se desenvolve por si mesmo, naturalmente.
Mas, nem todos progridem simultaneamente e do mesmo modo. Dá-se então que os
mais adiantados auxiliam o progresso dos outros, por meio do contato social”.
(Questão nº 779 de O Livro dos Espíritos). O progresso é da própria condição
humana, por isso o homem não pode opor-se-lhe. A ignorância e a maldade e até
mesmo leis injustas, podem retardar seu desenvolvimento, mas não anulá-lo.
Segundo o Espiritismo, as revoluções morais, como as revoluções sociais
infiltram-se nas idéias pouco a pouco. Elas como que germinam durante longo
tempo e subitamente irrompem desmoronando instituições, leis e costumes do
passado. As revoluções morais e sociais são condições para a realização do
progresso. São idéias novas, conceitos novos que se chocam com os existentes, os
quais já não mais satisfazem as necessidades e aspirações. (Veja questão nº 783
de O Livro dos Espíritos). Encontramos no comentário de Allan Kardec à Questão
nº 789 de O Livro dos Espíritos, esclarecimento de grande valia sociológica: “A
humanidade progride, por meio dos indivíduos que pouco a pouco se melhoram e
instruem. Quando estes preponderam pelo número, tomam a dianteira e arrastam os
outros. De tempos a tempos, surgem no seio dela homens de gênio que lhe dão
impulso; vêm depois, como instrumentos de Deus, os que têm autoridade e, nalguns
anos, fazem-na adiantar-se de muitos séculos”. Compreende-se, por tudo isso, a
importância da participação dos espíritas na sociedade, de uma forma esclarecida
e consciente. O espírita precisa conhecer os conceitos e fundamentos da Doutrina
Espírita para, com os meios que lhe sejam possíveis, colocá-los na organização
social em que vive. Para o aprimoramento da sociedade deve-se trabalhar a fim de
aumentar o número das pessoas esclarecidas, justas e amorosas de maneira a que
suas ações preponderem sobre a dos maus. Daí a reforma íntima não ser condição
para isolamento ou alienação, mas compromisso de união com os outros que têm o
mesmo ideal de amor e justiça, agindo deliberada e responsavelmente a benefício
de todos. O Espiritismo tem sua contribuição para dar, pois basta analisar seus
princípios filosóficos para ver que ele propõe o que a humanidade deseja: o
reino da justiça, obstando os abusos que impedem o progresso e a moralização das
massas. Como vemos, a proposição espírita da Lei do Progresso é um intenso e
profundo desafio aos espíritas para que trabalhem pelo progresso intelectual e
moral da humanidade. Com tal objetivo devem agir sobre a sociedade humana a fim
de que haja hábitos espiritualizados, desenvolvimento da inteligência, da
liberdade, elaboração de leis justas a benefício de todos, amparo ao fraco para
que ele não seja explorado pelo forte, respeito às crenças e opiniões, direito
ao necessário a todos (bem comum). Como fazer isso? Agindo não só no Movimento
Espírita como, também, de conformidade com a vocação e aptidão de cada um, nas
organizações e movimentos que, baseados em tais valores, procuram estruturar e
organizar a sociedade. A Lei de Igualdade e a Política. “É lei da natureza a
desigualdade das condições sociais? – Não; é obra do homem e não de Deus”.
(Questão nº 806 de O Livro dos Espíritos). Conseqüentemente, o espírita não deve
compactuar com toda situação que promova a desigualdade entre os homens: a
riqueza e a pobreza, o luxo e a miséria, o elitismo intelectual e a ignorância.
Deve lutar contra o egoísmo e o orgulho, identificando os múltiplos disfarces
com que eles se apresentam. Apoiará os movimentos que objetivem a igualdade dos
direitos humanos, reconhecendo apenas como válida a desigualdade pelo
merecimento decorrente do grau de aprimoramento intelectual e espiritual. O
Espiritismo brada veementemente contra a injustiça social, demonstrando a
necessidade de se agir por um mundo de Amor e Justiça. Para a Doutrina Espírita,
a desigualdade das riquezas pode se originar na desigualdade das faculdades,
como também pode ser fruto da velhacaria e do roubo. Considerando a diversidade
das faculdades intelectuais e os caracteres, não é possível a igualdade absoluta
das riquezas, no entanto, isso não é impedimento à igualdade de bem-estar. Logo,
é importante que cada ser humano tenha as condições mínimas para desenvolver
suas potencialidades. Isto não será possível enquanto grande parte das pessoas
estiver submetida à opressão, à exploração, à injustiça dos que desejam manter
ou possuir a riqueza o mais depressa possível. A riqueza, sob o aspecto ético ou
moral, jamais deverá originar, manter ou estimular a exploração do homem pelo
homem. Diz o Espiritismo: “Os homens se entenderão quando praticarem a lei da
justiça”. E isso será possível quando os direitos humanos forem devidamente
respeitados pelas sociedades políticas em que o homem vive. Portanto, a justiça
deve exercer sua tutela a fim de que cada um tenha o que é seu de direito. Não
se pode, desta forma, justificar com os conceitos espíritas a miséria como sendo
apenas prova ou expiação de espíritos que foram ricos e poderosos no passado. A
própria evidência sociológica demonstra o absurdo de tal generalização. O
orgulho e o egoísmo de homens e instituições é que têm ditado a miséria e a
pobreza sobre a face da terra. A miséria sempre foi muito maior do que a
riqueza, em todos os tempos vividos pela humanidade, até a presente época. Os
ricos têm sido minoria e os pobres maioria, numa grande desproporção. Isso não
permite pensar logicamente numa inversão tão simplista como querem alguns: “O
pobre de hoje é o rico de ontem” . Trata-se de uma acomodação injusta diante de
uma sociedade dirigida, ainda, pelo egoísmo e pelo orgulho. Acomodação que
deturpa o sentido da reencarnação, conforme o conceito que lhe é dado pelo
Espiritismo.
A Lei de Liberdade e a Política
“Em que condições poderia o homem gozar de absoluta liberdade? – Nas do
eremita no deserto. Desde que juntos estejam dois homens, há entre eles direitos
recíprocos que lhes cumprem respeitar; não mais, portanto, qualquer deles goza
de liberdade absoluta”. (Questão nº 826 de O Livro dos Espíritos). Para o
Espiritismo, o homem não goza de absoluta liberdade quando vivendo em sociedade,
porque uns precisam dos outros. A liberdade depende da fraternidade e da
igualdade. Onde houver uma convivência fraterna, exteriorizada em amor e
respeito, acatando-se o direito do próximo, haverá a prática da justiça e
conseqüentemente existirá liberdade. O egoísmo que tudo quer para si, e o
orgulho, a expressar o desejo de domínio, são inimigos da liberdade. Allan
Kardec comenta: “A liberdade pressupõe confiança mútua. Ora, não pode haver
confiança entre pessoas dominadas pelo sentimento exclusivista da personalidade.
Não podendo cada uma satisfazer-se a si própria senão à custa de outrem, todas
estarão constantemente em guarda umas com as outras. Sempre receosas de perderem
o que chamam seus direitos, a dominação constitui a condição mesma da existência
de todas pelo que armarão continuamente ciladas à liberdade e a coarctarão
quanto puderem”. (In Obras Póstumas, Capítulo Liberdade, Igualdade e
Fraternidade). O espírita deve combater o orgulho e o egoísmo em si mesmo e na
sociedade em que vive. A liberdade não se confunde com a devassidão que solta as
rédeas dos instintos. A liberdade de consciência é uma característica da
civilização em seu mais avançado estágio de progresso. Todavia, é evidente que
uma sociedade para manter o equilíbrio, a harmonia e o bem-estar precisa
estabelecer normas, leis e regulamentos portadores de sanções. A título de
respeitar a liberdade de consciência não vai-se admitir a propagação de idéias e
doutrinas prejudiciais à sociedade. Nada se lhes deve opor através da violência
e da força, mas através dos princípios do direito. Para o Espiritismo, os meios
fazem parte dos fins; não se pode pretender o amor, a justiça, a liberdade,
agindo por meios violentos, odiosos, injustos e coativos. Esse conceito de
liberdade deve levar o espírita à ação para implantar o bem na sociedade em que
vive para que o mal gradativamente desapareça. Para isso é preciso atuar
conscientemente, com amor e determinação.
A Lei de Justiça, Amor e Caridade e a Política
“Como se pode definir a justiça? – A justiça consiste em cada um respeitar os
direitos dos demais”. (Questão nº 875 de O Livro dos Espíritos). Para o
Espiritismo, justiça é: cada um respeitar os direitos dos demais. Também para
ele, duas coisas determinam tais direitos: A lei humana e a lei natural.
Esclarece, no entanto, que as leis humanas são formuladas de conformidade com os
costumes e caracteres de uma determinada época e sociedade, por isso são
mutáveis. Essas leis regulam algumas relações sociais, ao passo que a lei
natural rege até mesmo o que ocorre no foro da consciência de cada um. Dentre os
direitos de que o ser humano dispõe destaca o Espiritismo que o primeiro de
todos é o direito de viver. Isto está fundamentado na resposta à Questão nº 880
de O Livro dos Espíritos: “Por isso é que ninguém tem o direito de atentar
contra a vida de seu semelhante, nem fazer o que quer que possa comprometer-lhe
a existência corporal”. Compreende-se que as afirmações “atentar contra a vida”
e “comprometer-lhe a existência” são muito amplas, envolvendo tudo aquilo que
seja prejudicial à vida humana física e espiritual. Toda ação que atente contra
a vida não deve ser praticada pelo espírita, bem como a esse tipo de ação ele
deverá se opor, onde observe sua manifestação. O Espiritismo nos diz que o amor
e a caridade completam a lei de justiça, pois quando amamos o próximo desejamos
fazer-lhe todo o bem que nos seja possível, da mesma forma como gostaríamos que
nos fosse feito. Sob tal enfoque, afirmou Jesus: “Amai-vos uns aos outros”.
Segundo Jesus, a caridade não se restringe à esmola, ela abrange todo o
relacionamento humano. É de se ver a amplitude que, assim, assume a caridade,
impondo para seu aparecimento o exercício da lei de justiça. Depreende-se, pois,
que sem justiça não há caridade. Na Questão nº 888 de O Livro dos Espíritos
encontramos: “Condenando-se a pedir esmola, o homem se degrada física e
moralmente: embrutece-se. Uma sociedade que se baseie na Lei de Deus e na
justiça deve prover à vida do fraco, sem que haja para ele humilhação. Deve
assegurar a existência dos que não podem trabalhar, sem lhes deixar a vida à
mercê do acaso e da boa vontade de alguns”. Ressalta, assim, aos espíritas, a
imperiosidade de trabalhar para que a sociedade se baseie, cada vez mais na lei
de Deus e na justiça, a fim de que o direito à vida, à dignidade e ao respeito
humano seja reconhecido a todos indistintamente. É indispensável que, embasados
nos princípios espíritas, trabalhe-se para remover as causas geradoras da
miséria, da ignorância e dos vícios. A Renovação do Ser humano e da política
“Poderia sempre o homem, pelos seus esforços, vencer as suas más inclinações? –
Sim, e, freqüentemente, fazendo esforços muito insignificantes. O que lhe falta
é a vontade. Ah! quão poucos dentre vós fazem esforços!”. (Questão nº 909 de O
Livro dos Espíritos). O egoísmo expressando-se através de uma pessoa, ou de
grupos de pessoas, é o sentimento centralizador do interesse próprio em
detrimento dos outros. Preocupado com seu enquistamento no ser humano, perquiriu
Allan Kardec: “Fundando-se o egoísmo no sentimento do interesse pessoal, bem
difícil parece extirpá-lo no coração humano. Chegar-se-á a consegui-lo? – À
medida que os homens se instruem acerca das coisas espirituais, menos valor dão
às coisas materiais. Depois, necessário é que se reformem as instituições
humanas que o entretêm e excitam. Isso depende da educação”. (Questão nº 914 de
O Livro dos Espíritos). A orientação é no sentido de que a compreensão da vida
espiritual liberta o homem da escravização às coisas materiais, isto é, elas
deixam de ser um fim em si mesmas para se tornarem instrumentos do seu progresso
espiritual. Por outro lado denunciam claramente a necessidade de se
transformarem as instituições humanas que geram, motivam e estimulam o egoísmo.
O procedimento adequado a se intentar essa transformação é a educação no sentido
amplo, ou seja, a conscientização e prática individual e coletiva dos princípios
da justiça, da igualdade, da liberdade, do amor e da caridade. É imperioso,
pois, que se combata o egoísmo, indo às causas que o geram no homem e nas
instituições. Nessa linha de raciocínio, comenta Allan Kardec: “Louváveis
esforços indubitavelmente se empregam para fazer que a humanidade progrida. Os
bons sentimentos são animados, estimulados e honrados mais do que em qualquer
outra época. Entretanto, o egoísmo, verme roedor, continua a ser a chaga social.
É um mal real, que se alastra por todo mundo e do qual cada homem é mais ou
menos vítima. Cumpre pois, combatê-lo, como se combate uma enfermidade
epidêmica”. (Comentário à Questão nº 917 de O Livro dos Espíritos). É evidente
que nesse combate torna-se imperiosa a análise das “chagas da sociedade”, ou
seja, de órgãos, de instituições, organizações, sistemas econômicos e políticos
que entretecem e excitam o egoísmo de forma individual ou coletiva. Mais uma vez
fica claro que o aprimoramento do ser humano não pode ser feito apenas com a
auto-educação como processo de isolamento e não participação consciente dentro
da sociedade.
A Política e a Ação Social Espírita
“Por que, no mundo, tão amiúde, a influência dos maus sobrepuja a dos bons? –
Por fraqueza destes. Os maus são intrigantes e audaciosos, os bons são tímidos.
Quando estes o quiserem, preponderarão”. (Questão nº 932 de O Livro dos
Espíritos). Por todos os conceitos e princípios contidos em O Livro dos
Espíritos, até aqui analisados, observamos quanto essas idéias regeneradoras
tocam a sociedade humana em sua estrutura, organização e funcionamento.
Conceitos que em todas as circunstâncias e situações concretizam a aplicação da
verdade, da justiça e do amor. Há, pois, uma inequívoca contribuição Política,
sob o aspecto filosófico que o Espiritismo oferece à sociedade humana, a fim de
que ela se estruture, organize e funcione em termos de verdade, justiça e amor.
Disseram os Espíritos: “Quando bem compreendido, se houver identificado com os
costumes e as crenças, o Espiritismo transformará os hábitos, os usos, as
relações sociais”. (Questão nº 917 de O Livro dos Espíritos). Preocupado com a
possível felicidade humana, Allan Kardec questionou: “A felicidade terrestre é
relativa à posição de cada um. O que basta para a felicidade de um, constitui a
desgraça de outro. Haverá, contudo, alguma soma de felicidade comum a todos os
homens? A resposta dada pelos Espíritos, em sua primorosa síntese, encerra não
só lúcido esclarecimento, como um grande desafio à efetiva participação dos
espíritas para promoção da felicidade, ao afirmarem: “Com relação à vida
material é a posse do necessário. Com relação à vida moral, a consciência
tranquila e a fé no futuro”. (Questão nº 922 de O Livro dos Espíritos).
Ampliando esclarecimentos na Questão nº 927 da mesma obra, aditaram:
“Verdadeiramente infeliz o homem só o é quando sofre da falta do necessário à
vida e à saúde do corpo”. É de se entender, então, que o espírita tem uma ação
social, pois deve estar atento à prática da justiça e do amor a fim de que todos
tenham a posse do necessário e a saúde do corpo, o que necessariamente implica
em propugnar para que todos tenham alimentação adequada, vestuário, habitação,
educação, assistência médica, educação sanitária e até mesmo lazer. Advertiram
os Espíritos na Questão nº 930 do livro em estudo: “Numa sociedade organizada
segundo a lei do Cristo, ninguém deve morrer de fome”. Adita Allan Kardec: “Com
uma organização social criteriosa e previdente, ao homem só por sua culpa pode
faltar o necessário. Porém, suas próprias faltas são freqüentemente resultado do
meio onde se acha colocado. Quando praticar a lei de Deus, terá uma ordem social
fundada na justiça e na solidariedade e ele próprio também será melhor”.
Portanto, o espírita tem que participar e influenciar na sociedade em que vive,
procurando levar às instituições que a estruturam os valores e normas do
Espiritismo. Isso é uma participação política. Não pode preocupar-se apenas com
a reforma íntima, isolando-se em um “oásis de indiferentismo” pela sociedade em
que vive. É verdade que essa ação política conflitará com os interesses dos
egoístas e orgulhosos, individualmente ou em grupos. O Espírito Lázaro, no
Capítulo IX, item 8, de O Evangelho Segundo o Espiritismo nos alerta que “Cada
época é, assim, marcada pelo cunho da virtude ou do vício que a devem salvar ou
perder. A virtude da vossa geração é a atividade intelectual, seu vício é a
indiferença moral”. Assim, essa ação política deve objetivar o bem comum.
Aqueles que pretendem o bem não podem se omitir e essa participação liga-se
profundamente com a caridade, pois amar é querer o bem. Destarte, a expressão
política do amor é querer fazer o bem para todos. A participação do espírita,
inclusive do jovem, no processo político, social, cultural e econômico deve ser
consciente e responsável, tendo como diretriz os princípios e normas contidas em
O Livro dos Espíritos. Participação Política do Espírita. “… Sirva de base às
instituições sociais, às relações legais de povo a povo e de homem a homem o
princípio da caridade e da fraternidade e cada um pensará menos na sua pessoa,
assim veja que outros nela pensaram. Todos experimentarão a influência
moralizadora do exemplo e do contato”. (Questão nº 917 de O Livro dos
Espíritos).
COMO O ESPÍRITA NÃO DEVE ATUAR NA POLÍTICA:
- Levar a política partidária para dentro do Centro, das Entidades ou do
Movimento Espírita; - Utilizar-se de médiuns e dirigentes espíritas para apoiar políticos
partidários a cargos eletivos aos Poderes Executivo e Legislativo; - Catar votos para políticos que, às vezes, dão alguma “verbinha” para
asilos, creches e hospitais, mas cuja conduta política não se afina com os
princípios éticos ou morais do Espiritismo; - Apoiar políticos que se dizem espíritas ou cristãos, mas aprovam as
injustiças, as barganhas, a “politicagem” (usar a política partidária para
interesses egoísticos pessoais ou de grupos a que se ligam); - Participar da política partidária apenas por interesse pessoal, para
melhorar a sua vida e de sua família, divorciado em sua militância
político-partidária dos princípios e normas da Filosofia Espírita.
COMO O ESPÍRITA DEVE ATUAR NA POLÍTICA:
- O espírita pode e deve estudar e reflexionar sobre os princípios
político-filosófico-espíritas no Centro Espírita, pois eles estão contidos em
O Livro dos Espíritos, Parte Terceira, Das Leis Morais; - Através da análise, do estudo e da reflexão das normas e princípios acima
referidos, o espírita deve identificar o egoísmo, o orgulho e a injustiça nas
instituições humanas, denunciando-as e agindo para que elas desapareçam da
sociedade humana; - Confrontar os fundamentos morais e objetivos do Espiritismo com os
fundamentos morais e objetivos dos partidos políticos, verificando de forma
coerente qual ou quais deve apoiar e até mesmo participar como membro atuante,
se tiver vocação para tal, sabendo, no entanto, da responsabilidade que assume
nesse campo, já que sua militância deve sempre estar voltada para o interesse
do ser humano, em seus aspectos social e espiritual. Para isso, sua ação
política deverá estar em harmonia com os valores éticos (morais) do
Espiritismo que, em última análise, são fundamentalmente os mesmos do
Cristianismo; - Participar de organizações e movimentos que propugnem pela Justiça, pelo
Amor, pelo progresso intelectual, moral e físico das pessoas. Exemplos: clubes
de serviços, sindicatos, associações de classes, diretórios acadêmicos,
movimentos de respeito e defesa dos direitos humanos, etc.; - Fazer do voto um elevado testemunho de amor ao próximo; Considerando que a
sociedade humana é dirigida por políticos que saem das agremiações partidárias
e suas influências podem ajudar ou atrasar a evolução intelecto-moral da
humanidade, o voto, realmente, é uma forma de exprimir o amor ao próximo e à
coletividade; Deve, pois, analisar se a conduta do candidato
político-partidário tem maior ou menor relação com os princípios morais e
políticos (aspecto filosófico) do Espiritismo; - Participar conscientemente da ação política na sociedade, sem relegar o
estudo e a reflexão do Espiritismo a plano secundário. Pelo contrário, o
estudo e a reflexão dos temas espíritas deverão levá-lo a permanente
participação, objetivando a aplicação concreta do Amor e da Justiça ao ser
humano, seja individual ou coletivamente.
REFLEXÃO FINAL
“E quem governa seja como quem serve”. Jesus – (Lucas, 22:26) O advento da
Nova Era passará, inevitavelmente, pela renovação política. Nada muda se os
políticos não mudarem. “A força das coisas possibilita a mudança, mas não
construirá uma sociedade mais justa, mais livre, mais feliz, sem que cada
família, cada grupo, cada cidade, cada nação elabore seu projeto, organize sua
ação para chegar a essa sociedade melhor”. (Questões nº 860 e 1019 de O Livro
dos Espíritos). Cristo ensinou a paciência e a tolerância, mas nunca determinou
que seus discípulos estabelecessem acordo, tácito ou explícito, com os erros que
infelicitam o mundo. Em face dessa decisão foi à cruz e legou o último
testemunho de não-violência, mas também de não-acomodação com as trevas em que
se compraz a maioria das criaturas. Para o aprimoramento da sociedade deve-se
trabalhar a fim de aumentar o número de pessoas esclarecidas, justas e amorosas
de maneira que suas ações preponderem sobre a dos maus. Como diz J. Herculano
Pires (O Reino. São Paulo: Editora Edicel, p.137) “O chamado de uma nova ordem
social está clamando no coração do mundo. E o mundo não pode deixar de
atendê-lo, porque é um imperativo do progresso terreno, uma lei maior do que as
leis transitórias dos homens, é a expressão da própria vontade de Deus”. Não
poderemos esquecer, também, a preocupação de Deolindo Amorim (O Espiritismo e os
Problemas Humanos. São Paulo. Editora USE, 2ª edição, p.34) com o espírita e a
sociedade: “Para os espíritas, finalmente, o Cristianismo não é apático. Se, na
realidade, o cristão ficasse apenas na fé, rezando e contemplando o mundo à
grande distância, sem participar do trabalho de transformação do homem e da
sociedade, jamais a palavra do Cristo teria a influência ponderável. O
verdadeiro cristão, o que tem o Evangelho dentro de si, e não apenas o que
repete versículos e sentenças, não pode cruzar os braços dentro de um mundo
arruinado e poluído pelos vícios, pela imoralidade e pelo egoísmo”. Alterar essa
estrutura social que fomenta o egoísmo em todos os grupos sociais é providência
urgente. (Questão nº 573 de O Livro dos Espíritos). Precisamos aproveitar a
força das coisas, que está criando possibilidades de mudanças. Isso só pode ser
feito, como diz o Codificador, combatendo todas essas causas, senão ao mesmo
tempo, pelo menos por parte. Notemos a palavra por parte e não uma de cada vez.
Ao interferirmos em um sistema, diz-nos a teoria que não podemos interferir para
mudar, sem agir em uma família de coisas. Atuar em uma coisa de cada vez é
inócuo, pois o próprio sistema se defenderá eliminando o que o ameaça. No
entanto, o caminho parece ser colocar novos princípios em prática nas famílias,
instituições, escolas, igrejas, em todos os grupos sociais, de forma que muitos
movimentos sociais comecem a demonstrar a viabilidade de novas soluções.
(Questões nºs 791 a 793 e 797 de O Livro dos Espíritos). A polêmica idéia de que
o Brasil está destinado a cumprir o papel de “Coração do Mundo e Pátria do
Evangelho” sempre foi acompanhada de reflexões muito entusiastas. Se ele
realmente tem uma missão histórica a realizar, então é preciso começar a pensar
o Brasil de um ponto de vista mais realista. Só assim poderemos cumpri-la. O
Evangelho apresenta a mais elevada fórmula de vida político-administrativa aos
povos da terra. Os ideais democráticos do mundo não derivam senão do próprio
ensinamento de Jesus, nesse particular, acima da compreensão vulgar das
criaturas. A magna questão é encontrar o elemento humano disposto à execução do
sublime princípio. Quase todos os homens se atiram à conquista dos postos de
autoridade e evidência, mas geralmente se encontram excessivamente interessados
com as suas próprias vantagens no imediatismo do mundo O grande desafio do
espírita consciente é participar ativamente desse movimento de transformação
social, alicerçado no conhecimento das Leis Morais contidas em O Livro dos
Espíritos, buscando: – Politizar-se para escolher melhor; – Esclarecer amigos e
familiares sobre o voto consciente; – Participar de grupos de ação comunitária,
além do centro espírita; – Votar com amor, para eleger os mais moralizados.
Preponderar sobre os maus, como já vimos, é apenas uma questão de vontade. Foi a
esta conclusão que chegou Martin Luther King (Os Grandes Líderes – Nova
Cultural), ao afirmar: “Não há nada mais trágico neste mundo do que saber o que
é certo e não fazê-lo. Não posso ficar no meio de todas essas maldades sem tomar
uma atitude.” Toda a estrutura da Doutrina Social Espírita está calcada na
Codificação e esta deve ser a base para a construção de Uma Nova Sociedade.
Assim, a implantação da Política da Fraternidade deve ser para todo espírita
consciente UM IDEAL A SER ATINGIDO.
Ensaio elaborado a partir de transcrições do Livro O Espiritismo e a Política
para a Nova Sociedade – Aylton Paiva – Lins. Casa dos Espíritas.
Outras obras consultadas:
- Rumos para Uma Nova Sociedade – O Espiritismo e as Ciências Sociais –
Autores Diversos – São Paulo. Edições USE. - Estudos de Filosofia Social Espírita – Ney Lobo – FEB
- Alma e Luz – Francisco Cândido Xavier/Emmanuel – Instituto de Difusão
Espírita. - Jornal Opinião E. de Maio de 1997 – Especial – Eduardo Fernandes.
- O Livro dos Espíritos – Allan Kardec.
- O Evangelho Segundo o Espiritismo – Allan Kardec.
- A Gênese – Allan Kardec.
- Obras Póstumas – Allan Kardec.
- O Reino – J. H. Pires/Irmão Saulo – São Paulo. Editora Edicel.
- O Espiritismo e Os Problemas Humanos – D. Amorim & H. C.Miranda – São
Paulo: Editora USE. - Caminho, Verdade e Vida – Francisco Cândido Xavier/Emmanuel – FEB.
- Os Grandes Líderes – Martin Luther King – Nova Cultural.
- Como Não Ser Enganado nas Eleições – Gilberto Dimenstein – Editora Ática.
- Elementos da Engenharia Social – Décio Silva Barros – Editora do Escritor
– SP.