Conceito – Toda e qualquer tentativa para elucidar a magna questão da
Divindade redunda sempre inócua, senão infrutífera, traduzindo esse desejo a vã
presunção humana, na incessante faina de tudo definir e entender.
Acostumado ao imediatismo da vida física e suas manifestações, o homem
ambiciona tudo submeter ao capricho da sua lógica débil, para reduzir à sua
ínfima capacidade intelectual a estrutura causal do Universo, bem assim as
fontes originárias do Criador.
Desde tempos imemoriais, a interpretação da Divindade tem recebido os mais
preciosos investimentos intelectivos que se possam imaginar. Originariamente
confundido com a Sua Obra, mereceu temido pelos povos primitivos que legaram às
Culturas posteriores a sedimentação supersticiosa das crendices em que
fundamentavam o seu tributo de adoração, transitando mais tarde para a
humanização da Divindade mesma, eivada pelos sentimentos e paixões transferidos
da própria mesquinhez do homem.
À medida, porém, que os conceitos éticos e filosóficos evoluíram, a
compreensão da
Sua natureza igualmente experimentou consideráveis alterações. Desde a
manifestação feroz à dimensão transcendental, o conceito do Ser Supremo recebeu
de pensadores e escolas de pensamento as mais diversas proposições, justificando
ou negando-Lhe a realidade.
Insuficientes todos os arremedos filosóficos e culturais, quanto científicos,
posteriormente, para uma perfeita elucidação do tema, concluiu-se pela
legitimidade da Sua existência, graças a quatro grupos de considerações, capazes
de demonstrá-Lo de forma irretorquível e definitiva, a saber: a) cosmológicas,
que O explicam como a Causa Única da sua própria causalidade, portanto real,
sendo necessariamente possuidor das condições essenciais para preexistir antes
da Criação e sobreexistir ao sem-fim dos tempos e do Universo; b) ontológicas,
que O apresentam perfeito em todos os Seus atributos e na própria essência,
explicando, por isso mesmo, a Sua existência, que não sendo real, não
justificaria sequer a hipótese do conceito, deixando, então, de ser perfeito.
Procedem tais argumentações desde Santo Anselmo, dos primeiros a formulá-las,
enquanto que as de ordem cosmológica foram aplicadas inicialmente por
Aristóteles, que O considerava o “Primeiro motor, o motor não movido, o Ato
puro”, consideração posteriormente reformulada por Santo Tomás de Aquino, que
nela fundamentou a quase totalidade da Teologia Católica; c) teleológicas,
mediante as quais o pensamento humano, penetrando na estrutura e ordem do
Universo, não encontra outra resposta além daquela que procede da existência de
um Criador. Ante a harmonia cósmica e a beleza, quanto à grandeza matemática e
estrutural das galáxias e da vida, uma resultante única surge: tal efeito
procede de uma Causa perfeita e harmônica, sábia e infinita; d) morais,
defendidas por Emmanuel Kant, inimigo acérrimo das demais, que, no entanto, eram
apoiadas por Spinoza, Bossuet, Descartes e outros gênios da fé e da razão. Deus
está presente no homem, mediante a sua responsabilidade moral e a sua própria
liberdade, que lhe conferem títulos positivos e negativos, conforme o uso que
delas faça, do que decorrem as linhas mestras do dever e da autoridade. Essa
presença na inteligência humana, intuitiva, persistente, universal, faz que
todos os homens de responsabilidade moral sejam conscientemente responsáveis,
atestando, assim, inequivocamente, a realidade de um Legislador Absoluto,
Suprema Razão da Vida.
Olhai o firmamento e vede a Obra das Suas mãos, proclama o Salmista Davi, no
Canto 19, verso primeiro, conduzindo a mente humana à interpretação teleológica,
cosmológica e cosmogônica, para entender Deus.
Examina a estrutura de uma molécula e o seu finalismo, especialmente diante
do ADN, do ARN de recente investigação pela Ciência, que somente a pouco e pouco
penetra na essência constitutiva da forma, na vida animal, e a própria indagação
responde silogisticamente de maneira a conduzir o inquiridor à causa essencial
de tudo: Deus!
Outros grupos de estudiosos classificam os múltiplos argumentos em ordens
diferentes: metafísicos, morais, históricos e físicos, abrangendo toda a gama do
existente e do concebível.
Desenvolvimento – Diversas escolas filosóficas do século passado
desejaram padronizar as determinações divinas e a própria Divindade em linha de
fácil assimilação, na pretensão de limitarem o Ilimitado. Outras correntes de
pesquisadores aferrados a cruento materialismo, na condição de herdeiros diretos
do Atomismo greco-romano, do pretérito, descendentes, a seu turno, de Lord
Bacon, como dos sensualistas e cépticos dos séculos XVIII e XIX, zombando da fé
ingênua e primitiva, escravizada nos dogmas ultramontanos dos religiosos do
passado, tentaram aniquilar histórica e emocionalmente a existência de Deus, por
incompatível com a razão, conforme apregoavam, mediante sistemas sofistas e
conclusões científicas apressadas, como se a própria razão não fosse
perfeitamente confluente com o sentimento de fé, inato em todo homem, como o
demonstram os multifários períodos da História.
Sócrates já nominava Deus como “A Razão Perfeita”, enquanto Platão O
designava por “Idéia do Bem”.
O neoplatonismo, com Plotino, propôs o renascimento do Panteísmo, fazendo
“Deus, o Uno Supremo”, que reviverá em Spinoza, não obstante algumas discussões
na forma de Monismo, que supera na época o Dualismo cartesiano. O monismo recebe
entusiástico apoio de Fichte, Hegel, Schelling e outros, enquanto larga faixa de
pensadores e místicos religiosos empenhava-se na sobrevivência do Dualismo.
Mais de uma vez alardeou-se que “Deus havia morrido”, proclamando-se a
desnecessidade da fé como da Sua paternidade, para, imediatamente, reiteradas
vezes, com a mesma precipitação, voltarem esses negadores a aceitar a Sua
realidade.
A personagem concebida por Nietzche, que sai à rua difundindo haver “matado
Deus”, chamando a atenção dos passantes, após o primeiro choque produzido nos
círculos literários e intelectuais do mundo, no passado, estimulou outras mentes
à negação sistemática, Fenômeno idêntico acontecera no século anterior, quando
os convencionais franceses, supondo destruir Deus, expulsaram os religiosos de
Paris e posteriormente de todo o país, entronizando a jovem Candeille,
atormentada bailarina do Ópera, como a Deusa Razão, que deveria dirigir os
destinos do pensamento intelectual de então, ante Robespierre e outros, em
Notre-Dame. Logo, porém, depois de múltiplas vicissitudes, o curto período da
Razão fez que Deus retornasse à França, e muitos dos seus opositores a Ele se
renderam, declarando haver voltado ao Seu regaço, cabisbaixos, arrependidos,
melancólicos. Deus vencia, mais uma vez, a prosápia utopista da ignorância
humana!
Repetida a experiência no último quartel do “século das luzes”, tornou a ser
exilado da Filosofia e da Ciência por uns e reconduzido galhardamente por outros
expoentes culturais da Humanidade.
Novamente, ante o passo avançado da tecnologia moderna, através da
multiplicidade das ciências atuais, pretende-se um Cristianismo sem Deus, uma
Teologia não teísta, fundamentada em cogitações apressadas, que pretendem levar
o homem à “busca das suas origens”, como desejando reconduzi-lo à furna, em vez
de situá-lo em a Natureza, mantê-lo selvagem por incapacidade de fazê-lo
sublime.
Tal fenômeno reflete a apressada decadência histórica e moral das velhas
Instituições, na Terra de hoje, inaugurando uma Nova Era…
As construções sociais e econômicas em falência, as arquiteturas religiosas
em soçobro, as aferições dos valores psicológicos e psicotécnicos negativamente
surpreendentes, o descrédito inspirado pelos dominadores, em si mesmos
dominados, pelos vencedores lamentavelmente vencidos pela inferioridade das
paixões em que se consomem, precipitaram o agoniado espírito humano na “busca do
nada”, das formas primeiras, rompendo com tudo, como se fora possível abandonar
a herança divina inata indistintamente em todas as criaturas, para tentar
esquecer, apagar e confundir a inteligência com os impulsos dos instintos, num
contumaz e malsinado esforço de contraditório retorno às experiências
primitivistas da forma, quando ainda nas fases longevas de formações e
reformações biodinâmicas…
Concomitantemente, porém, surgem figurações morais, espirituais, mística e
científicas, sofrendo os embates que a dúvida e o cepticismo impõem, resistindo,
todavia, estoicamente, na afirmação da existência de Deus, apoiadas pela
Filosofia e Ética espíritas, que são as novas matrizes da Religião do Amor,
pregada e vivida por Nosso Senhor Jesus-Cristo.
Conclusão – “Deus é Amor”, afirmava João.
“Meu Pai”, dizia reiteradamente Jesus, conceituando-O da forma mais vigorosa
e perfeita que se possa imaginar.
E Allan Kardec, mergulhando as nobres inquirições filosóficas nas fontes
sublimes da Espiritualidade Superior, recolheu através dos Imortais que “Deus é
a Inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”, em admirável
síntese, das mais felizes, completando a argumentação com a asserção de que o
homem deve estudar “as próprias imperfeições a fim de libertar-se delas, o que
será mais útil do que pretender penetrar no que é impenetrável”, concordante com
o ensino do Cristo, em João: “Deus é Espírito, e importa que os que O adoram, O
adorem em espírito e verdade.”
Estudo e meditação:
“Onde se pode encontrar a prova da existência de Deus?”
“Num axioma que aplicais às vossas ciências. Não há efeito sem causa.
Procurai a causa de tudo o que não é obra do homem e a vossa razão responderá.”
Para crer-se em Deus, basta se lance o olhar sobre as obras da Criação. O
universo existe, logo tem uma causa. Duvidar da existência é negar que todo
efeito tem uma causa a avançar que o nada pôde fazer alguma coisa. (O Livro dos
Espíritos, Allan Kardec, questão 4.)
“A existência de Deus é, pois, uma realidade comprovada não só pela
revelação, como pela evidência material dos fatos. Os povos selvagens nenhuma
revelação tiveram; entretanto, crêem instintivamente na existência de um poder
sobre-humano. Eles vêm coisas que estão acima das possibilidades do homem e
deduzem que essas coisas provêm de um ente superior à Humanidade. Não demonstram
raciocinar com mais lógica do que os que pretendem que tais coisas se fizeram a
si mesmas?” (A Gênese, Allan Kardec, cap. II, item 7.)
Texto extraído do livro Estudos Espíritas, de Divaldo Pereira Franco pelo
espírito de Joanna de Ângelis.