Falar Para Quem Quer Ouvir
O espírita não deve ter a preocupação de converter quem quer que seja. Deve,
isso sim, preocupar-se em informar tudo sobre a Doutrina, desde que lhe
solicitem informações. Deve, na medida de seus conhecimentos, dar explicações
baseadas na lógica doutrinária aos problemas e aflições que seu semelhante lhe
apresentar. Nunca, porém, dizer: “Faça assim, que você vai melhorar”. Dar ao
semelhante aos informações simples e corretas, que poderão ser utilizadas por
ele em benefício próprio; se ele quiser. Se a pessoa que nos pede informações e
dados achar que nossa resposta – a explicação da Doutrina – não lhe serve, é um
direito que não devemos, nem podemos, tomar-lhe. A responsabilidade de melhorar
ou piorar de vida é intransferível; cabe a cada indivíduo. Ao espírita cabe tão
somente fornecer às pessoas os elementos necessários à tomada consciente dessa
responsabilidade; daí para frente, o trabalho é do próprio indivíduo.
Jesus, quando ensinava a multidão em geral ou as pessoas em particular, nunca
disse: “Não faça isto, que lhe acontecerá aquilo”. Sempre propunha parábolas,
que são as melhores formas de estimular o raciocínio e de não ferir o
livre-arbítrio de ninguém. Dizia, por exemplo: “Havia uma pessoa que agiu desta
ou daquela forma e lhe aconteceu isto ou aquilo”. Cada um que vestisse a
carapuça. Cada qual que fizesse as analogias, se colocasse no lugar do cidadão
referido na parábola, e tomasse as decisões que melhor achasse acertadas para o
seu caso. O desfecho daquele procedimento, Jesus já lhe havia dito pela
parábola. Cabia ao ouvinte agir. Jesus nunca o impediria de proceder como melhor
lhe aprouvesse. Entretanto, após ouvir a parábola, o ouvinte já estava informado
das conseqüências; se continuasse no caminho errado, seria muito mais
responsável. “Não foi por falta de aviso”, como se costuma a dizer aos amigos
que erram.
A divulgação espírita deve, portanto, preocupar-se em informar, esclarecer.
Não deve se preocupar com quantidade, mas com qualidade. Não deve ir buscar
ninguém que não esteja interessado no Espiritismo, mas fazer todo o possível
para esclarecer aqueles que vão ao seu encontro. Nunca fugir às explicações
diante daqueles que procuram o Espiritismo; nunca se preocupar em perder tempo
com aqueles que não se interessam em ouvir nada sobre a Doutrina. “Não dar
pérolas aos porcos e também um ensinamento evangélico. Os porcos nunca saberão o
que fazer com as pérolas: é um presente muito requintado para quem só se
preocupa em comer. E que não escolhe a qualidade da comida; contenta-se até com
detritos. Não perder tempo, entretanto, em convencer alguém, enquanto muitos
estão à nossa espera, ansiosos para ouvir explicações, para serem consolados
pelo ensinamento evangélico.
O orador espírita deve também se preocupar em levar sua mensagem para a média
das pessoas. Não muito elevado, mas também não muito rasteiro para não confundir
as inteligências que estão exatamente lutando para sair do lodo. Ter o bom senso
para avaliar a capacidade de apreensão e compreensão do auditório é
responsabilidade de todo orador espírita. Não falar muito em citações
evangélicas, “ipsis literis”, mas utilizar a essência de tais citações,
aplicando-as a fatos de nossos dias, a eventos ligados à vida da média do
auditório.
Pois é preciso ter em mente também penetrar o entendimento dos ouvintes
daquela época; sua essência perene e universal, mas sua vestimenta, a forma, é
transitória e mortal – morre com a mudança dos costumes. Deve, portanto, o
orador “vestir” a essência evangélica com motivos atuais e próximos de todos
seus ouvintes. Do contrário, a palestra soará falsa, soará de uma erudição
ridícula. E o caso de falarmos, por exemplo, na linguagem bíblica, com todos os
vos e os “ides”. Numa palestra informal, essa preocupação gera frases ridículas.
Se a multidão vem até um Centro Espírita, é importante saber o que realmente
ela quer. Tomar nas mãos o material que ela nos oferece; o material de suas
preocupações e aflições. E, assim, jogar inicialmente a tábua para aquele que se
está afogando a fim de trazê-lo à margem. A seguir, se o candidato ao afogamento
estiver realmente interessado, ensiná-lo a nadar. Pois que todos terão de
aprender a nadar para vencer as correntes do rio da Vida. Mas muitos não se
sentem “maduros” para entrar na escola de natação; preferem sofrer mais algumas
experiências de afogamento. Porém devemos estar sempre prontos a lhes jogar a
tábua mais uma vez e, também, mais uma vez a lhes respeitar o livre-arbítrio.
(Do livro “Caminhos de Libertação”, de Valentim Lorenzetti)