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Patch Adams

Patch Adams

Médico famoso inspirou filme que, por sua vez, fez surgir os Doutores da Alegria

A conceituada revista Veja, edição de 25 de fevereiro de 2004 (ano 37, edição 1842, Editora Abril), publicou entrevista com o famoso médico americano Patch Adams, cuja atuação inspirou o belo filme O Amor é Contagioso, estrelado pelo ator Robin Williams no papel principal, que, visto por milhões de telespectadores em todo mundo, motivou o surgimento dos grupos Doutores da Alegria, inclusive no Brasil.

Como cita o texto de Rosana Zakabi, da citada revista, “(…) Há três décadas, Adams transforma os quartos dos hospitais que visita em um verdadeiro picadeiro. Sua especialidade é animar pacientes com brincadeiras para reduzir o sofrimento deles (…)”. Autor de três livros, ele “(…) defende sentimentos como humor, compaixão, alegria e esperança no tratamento de pacientes (…)”, dirige uma instituição de saúde que atende pacientes gratuitamente e ainda profere palestras sobre a atividade que o tornou mundialmente conhecido.

A entrevista tem trechos muito interessantes, que podemos ligar ao pensamento espírita. Escolhemos apenas três, para uma análise à luz da Doutrina Espírita (com destaques de nossa autoria):

a) “(…) Como todo ser humano, o médico pode errar. Essa idéia de que o médico tem de ser perfeito também prejudica a relação com o paciente. Faz com que este coloque toda a responsabilidade do que ocorre com ele nas mãos do médico. E isso é errado. O paciente é mais responsável pela própria recuperação do que o médico que o está tratando.(…)”

b) “(…) Medicina envolve relacionamento entre médico e paciente. Um bom médico é aquele que sabe cultivar essa relação por meio da troca de experiências, amizade, humor, confiança (…)”

c) “(…) O paciente com fé tem uma capacidade maior de entrega, o que lhe traz conforto em todas as situações. (…) Quando comecei a trabalhar como plantonista em hospitais, descobri que as famílias que seguiam alguma religião se sentiam mais calmas quando rezavam do que quando tomavam algum tranqüilizante (…)”

Os três trechos com negrito dispensam maiores comentários. Eles são da própria essência psicológica de pacientes, seus familiares e profissionais da área médica. A postura de médicos e pacientes é vital para o êxito dos tratamentos e a recuperação dos pacientes, onde a fé exerce papel de preponderância.

Mas não há como negar que os estímulos do ânimo, principalmente quando trazidos pelo médico, alteram o quadro mental dos pacientes e suas famílias. Daí a proposta do Dr. Patch, tão bem interpretada por Robin Williams.

É que, em síntese, precisamos todos uns dos outros. A solidariedade é vital para o equilíbrio e a saúde das criaturas humanas. Todo ser precisa sentir-se amado, valorizado. Quando desprezado, esquecido, tende a entregar-se ao desânimo, piorando as condições de saúde. O bom ânimo reduz o sofrimento, esta a questão chave.

Allan Kardec, em sua Revista Espírita* (março de 1869), em artigo intitulado A carne é fraca, escreveu: “(…) o médico do corpo pode se fazer o médico da alma? (…) Sim, sem dúvida, num certo limite; é mesmo um dever que um bom médico não negligencie jamais, desde o instante que vê, no estado da alma, um obstáculo ao restabelecimento da saúde do corpo (…)”

E perguntamos: quantos não são os casos onde a desesperança mantém a enfermidade? Notem os leitores o sentido da frase: “desde o instante que vê, no estado da alma, um obstáculo ao restabelecimento da saúde do corpo” (destacamos). Quantas dificuldades na cura de um paciente quando este permanece indiferente, alheio à própria cura, muitas vezes em virtude do rancor que alimenta, da dúvida que não cessa, do medo que o atormenta…

Daí o sucesso dos Doutores da Alegria em hospitais. A alegria, a brincadeira espontânea, o desvio da mente de preocupações exageradas ou o expurgo do medo e da insegurança são facilitadores da recuperação orgânica, por simples efeito mental e psicológico.

O espírito Alfred de Musset, em mensagem que Kardec publicou igualmente na Revista Espírita*, edição de julho de 1861, pergunta: “(…) Qual é aqui o verdadeiro louco: aquele que espera, ou aquele que desespera? (…)” Referida mensagem refere-se aos internos terminais em hospitais. O Espírito relaciona o desespero dos que em nada crêem com aqueles que recebem as informações sobre as realidades da imortalidade e aguardam a própria libertação. Chega a citar a presença carinhosa dos espíritos que assistem os enfermos e os aguardam no momento da libertação. Muitos desses que mantêm postura calma, de quem aguarda com serenidade, muitas vezes são taxados de loucos (até pelas visões espirituais que descrevem), daí a razão da pergunta que transcrevemos.

O fato é, porém, que sempre que há esperança, há calma, e esta é determinante na recuperação da saúde. Com a alegria nos hospitais, espalhada inclusive pelo comportamento de médicos e enfermeiros, defendida pelo Médico da Alegria, pacientes encontrarão saúde mais rapidamente.

Por isso é oportuno transcrever trecho da mensagem A Esperança, ditado pelo Espírito Felícia, e publicada por Allan Kardec na edição de fevereiro de 1862, de sua Revista Espírita*:

“Eu me chamo a Esperança; sorrio à vossa entrada na vida; eu vos sigo passo a passo, e não vos deixo senão nos mundos onde se realizam, para vós, as promessas de felicidade que ouvis, sem cessar, murmurar aos vossos ouvidos. Eu sou vossa fiel amiga; não repilais minhas inspirações: eu sou a Esperança”.

Embora declare não acreditar em Deus, o Dr. Patch realizou obra incomparável no planeta e continua firme em seus propósitos. Distribuiu esperança aos pacientes internos em hospitais; motivou que outros grupos e colegas médicos fizessem o mesmo; o filme que inspirou comoveu platéias em todo mundo e realiza obra meritória da maior importância.

E como, em essência, o médico, para alcançar êxito numa iniciativa como essa, depende da postura do paciente, a ação do Dr. Adams tem o mérito da caridade – aquela que vê em cada ser humano um espírito em escala evolutiva, que merece respeito e pede estímulos para superar suas dificuldades – , que busca os infortúnios ocultos, descortinando novos horizontes, agora de esperança, para aqueles considerados esquecidos, desprezados ou que não conseguem, por si mesmos, alterar o panorama em que se fixaram.

Podemos analisar o assunto sob vários ângulos, à luz do Espiritismo ou da Medicina, ou mesmo da Psicologia, mas o destaque é mesmo para afirmar que o bom humor e a esperança são bons auxiliares no tratamento dos doentes, como destacou a reportagem da revista.

*Edição do IDE-Araras, tradução de Salvador Gentille

Matéria publicada originariamente na RIE – Revista Internacional de Espiritismo, edição de agosto de 2004.

Orson Peter Carrara