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Verdade e dogma

José Reis Chaves

Quando em suas elucubrações teológicas, os teólogos ortodoxos imaginaram coisas exóticas, outros teólogos, usando a razão, contestaram-nas. Mas elas foram-lhes impostas à força pelos teólogos ortodoxos apoiados pelo poder civil. E assim surgiram os dogmas, como sendo verdades intocáveis, quando uma verdade só pode ser absoluta, se for divina. Respeitemo-los. Mas eles esfacelaram o Cristianismo. Quantas divisões, quanto ateísmo, quanto sangue derramado e quantos corpos humanos vivos viraram churrasco por causa deles!

Apesar do dogma da divindade de Jesus, Ele sempre se proclamou Filho de Deus, jamais Deus. Foi o maior herege judeu. Porém, foi ardoroso defensor do monoteísmo judaico. E se Ele fosse Deus mesmo, haveria mais de um Deus. Aliás, Deus é o Criador, Jesus Cristo é criatura emanada do Criador. São Paulo diz: “Jesus Cristo é o primogênito de todas as criaturas.” E é verdade que esse apóstolo afirmou que em Jesus habitou plenamente a divindade, mas em nós ela habita também, embora ainda não plenamente.

Cristo (Ungido) é o Espírito de Jesus (Salvador). E espírito e corpo não são a mesma coisa. O próprio Jesus ensinou-nos: “A carne para nada aproveita. O que importa é o espírito que vivifica”. E lemos em Eclesiastes 12, 7: “E o pó volte à terra, como o era, e o espírito volte a Deus, que o deu”. Espírito e corpo são inseparáveis, sim, enquanto o espírito está encarnado. Mas isso não significa que sejam a mesma coisa. E, ao morrer o corpo, vemos o quanto ele é diferente do espírito imortal!

E eis o próprio Jesus mostrando-nos na Bíblia que Ele não é Deus propriamente dito: “Por que me chamas bom? Ninguém é bom senão um só, que é Deus” (Marcos 10, 18). “Eu não vim de mim mesmo, mas foi Deus quem me enviou” (João 7, 42). “Quando será o dia ninguém sabe, nem mesmo os anjos que estão nos céus, nem mesmo o Filho, mas tão-somente o Pai” (Mateus 24, 35 e 36). “O Pai é maior do que eu” (João 14, 28). “Subo para meu Pai e vosso Pai, para meu Deus e vosso Deus” (João 20, 17). “O Deus de nossos pais ressuscitou a Jesus” (Atos 6, 30 e 31). Ora, se Jesus fosse Deus, Ele mesmo se ressuscitaria a si próprio!

O título de “Mãe de Deus” (Theotokos) dado a Maria não é bíblico. É dogma. O certo é Mãe de Jesus (Cristotokos), como ensinou Ário, apoiado por mais de 300 bispos, e como rezam os espíritas. É aberrar de Deus afirmarmos que Ele tem mãe, por Maria ser Mãe de Jesus, o qual não é Deus, como estamos vendo.

Falam que Jesus é Deus, por Ele ter dito que Ele e o Pai são um só. Acontece que Ele disse também: “Sejamos nós, vós e eu, um só com o Pai”. E São João chama Jesus de Unigênito do Pai (interpolação?), mas nós também somos filhos de Deus, pois foi Ele mesmo quem no-lo ensinou, inclusive na oração do Pai-Nosso.

Há as expressões Deus-Pai e Deus-Filho.E vemos na Bíblia, por várias vezes, Jesus ou Deus-Filho orando ao Deus-Pai. Mas nunca vemos Deus-Pai orando a Deus-Filho!

Autor do Livro “A Face Oculta das Religiões” (Ed. Martin Claret), entre outros. E-mail: escritorchaves@ig.com.br