André Luiz: Cruz ou Chagas?
“Embalde os companheiros encarnados procurariam o médico André Luiz nos catálogos da convenção. Por vezes o anonimato é filho legítimo do entendimento e do amor. André precisou, igualmente, cerrar a cortina sobre si mesmo.” – Emmanuel (Prefácio do livro “Nosso Lar”, FEB)
1. Introdução
A revista “Isto É” de 18 de setembro de 1991 publicou uma reportagem especial sobre Chico Xavier onde, na página 34, traz o presente tema da seguinte forma: “pelo sim, pelo não, quando o espírito Carlos Chagas apareceu pela primeira vez para ele, pediu para ser chamado de André Luiz, para evitar novos problemas com os herdeiros.”
Temos visto bons expositores da doutrina abordarem o tema afirmando ser o sanitarista Oswaldo Cruz o instrutor desencarnado, e outras, Carlos Chagas. Nada temos contra a comparação biográfica visando identificação de personalidades, como as faz o nosso prezado Hermínio Miranda em alguns de seus trabalhos como: “Hannemann, O Apóstolo da Medicina Espiritual”, “Eu sou Camille Desmoulins” e “As Marcas do Cristo”. Acreditamos, entretanto, que a afirmativa gratuita, feita de oitiva e supostamente atribuída a um médium ou a um espírito, depõe contra a seriedade que devemos ter para com o conteúdo do Espiritismo.
Fizemos, então, uma pesquisa rápida, consultando algumas enciclopédias e artigos biográficos que tratassem de dados pessoais dos dois cientistas. Pesquisamos também os livros “Nosso Lar” e “No Mundo Maior”, de onde retiramos alguns dados da encarnação pregressa de André Luiz. Obtivemos, então, as seguintes informações que passamos a analisar.
2. “Causa Mortis”
A “causa-mortis” de André Luiz é descrita pelo médico espiritual Henrique de Luna. Ele teria desencarnado no hospital, após “duas cirurgias graves devido a oclusão intestinal” que, por sua vez, derivava de “elementos cancerosos”. Luna cita ainda sífilis, o comprometimento de rins e fígado e do aparelho gástrico. (Nosso Lar, p.32, 33, 41).
A biografia de Cruz fala em “crises renais complicadas por problemas respiratórios” e as de Chagas citam “ataque cardíaco” e “morreu de infarto sobre a mesa de escritório, trabalhando”.
3. Genitor
Do pai de André Luiz, sabemos que ficou “12 anos numa zona de trevas compactas do umbral” e que era comerciante. André dá-lhe o nome Laerte em seus escritos. (Nosso Lar, p.91 e 190 a 194). Como a narrativa se dá no ano de 1939, se o dado se referir a todo o período post-mortem do genitor de André Luiz, inferimos como ano possível da desencarnação o ano de 1927.
O pai de Cruz chamava-se Bento, era médico e desencarnara em 1892, ou seja, 35 anos antes da data estimada para Laerte.
O pai de Chagas chamava-se José Justiniano, era fazendeiro e plantador de café e desencarnou em 1901 ou 1902, ou seja, cerca de 25 anos antes da data estimada por nós para Laerte.
4. Irmãos
A mãe de André Luiz fala em três irmãs do autor espiritual. Duas que ela chamou de Clara e Priscila e que estavam presas à região do umbral, e uma outra, chamada de Luísa, que havia desencarnado quando André Luiz era pequenino e auxiliava a mãe em suas atividades. É possível que ele tivesse mais irmãos, não citados naquela oportunidade. (Nosso Lar, p. 92)
Oswaldo Cruz era primogênito e possuía mais cinco irmãs. Chagas possuía cinco irmãos, Maria Rita (que era meia-irmã, filha do primeiro casamento do pai), Carlos, José (que desencarnou com menos de quatro anos de idade), Marieta e Serafim.
5. Filhos
Ao revisitar sua casa, André Luiz encontra a filha mais velha casada (primogênita) e uma outra filha mais jovem conversando sobre “seu único filho varão” que estaria ” por aí, fazendo loucuras” (Nosso Lar, p. 272 e 273). Ao se referir à sua família o instrutor fala em “uma esposa e três filhos”. (Nosso Lar, p.275)
Cruz teve seis filhos. Um deles, Bento, seguiu-lhe a carreira e chegou a trabalhar com ele.
Chagas teve dois filhos legítimos, Evandro e Carlos, que lhe seguiram a carreira e diplomaram-se antes da sua desencarnação. (Evandro em 1926 e Carlos em 1931).
6. Vocação para Medicina
André Luiz atribui sua carreira ao avô, que lhe deixara uma quantia significativa para fazer o curso. “Em muitas ocasiões manifestei o desejo que ele se consagrasse à medicina”. (No Mundo Maior, p. 234).
O biógrafo de Cruz atribui o interesse pela medicina ao pai de Oswaldo, Bento. O biógrafo de Chagas (que é o próprio filho, Carlos) atribui a vocação à influência do tio de seu pai, Calito, que formou-se em medicina na corte e organizou uma casa de saúde em Oliveira – MG.
7. Época da Desencarnação
André Luiz não nos dá uma data para a sua desencarnação, mas é possível inferi-la com precisão de cerca de um ano, a partir dos seguintes trechos de seus escritos:
André Luiz permanece “mais de oito anos consecutivos” nas esferas inferiores, após sua desencarnação. (Nosso Lar, p. 47)
Em recuperação, na colônia, cita um episódio ocorrido em agosto de 1939 (Nosso Lar, p. 132) e ele não havia ficado ainda por um ano na colônia espiritual (Nosso Lar, p.253). Temos então como época possível de sua desencarnação o ano de 1930 (1939 – 8 – 1), com uma faixa de erro de dois anos, ou seja, entre 1929 e 1931.
Oswaldo Cruz desencarnou em 11 de fevereiro de 1917, aos 44 anos. Carlos Chagas desencarnou um 8 de novembro de 1934, aos 55 anos.
8. Algumas Conclusões
Apesar de termos feito inferências que alguns leitores podem não considerar como exatas (o período da desencarnação do pai de André Luiz e do próprio André Luiz), os dados biográficos são muito discrepantes. Será possível que o autor espiritual tivesse alterado fatos de sua vida como o número, sexo e destino dos filhos, profissão paterna, seu período de permanência nas regiões inferiores, sexo dos irmãos e doenças que levaram à desencarnação, para preservar oculta sua identidade? Teria o autor espiritual tecido tantos comentários sobre ficções? Consideramos pouco provável.
Cabe-nos adotar a posição rigorosa do codificador do Espiritismo, rejeitando nove verdades para não aceitar uma mentira.
9. Referências Bibliográficas
ANDRÉ LUIZ. Nosso Lar.(23ª ed.) Rio de Janeiro: FEB, 1981.Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Primeira edição em 1944.
____________ No Mundo Maior. (9ª ed.) Rio de Janeiro: FEB, 1981. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Primeira edição em 1947.
CHAGAS FILHO, Carlos. Cenas da vida de Carlos Chagas. Ciência e Cultura. São Paulo, SBPC, v. 31, suplemento.
Enciclopédia Internacional do Mirador.
VERÍSSIMO, Suzana. Carlos Chagas: história sem fim. Superinteressante. São Paulo, Abril Cultural, mai 1991.
ZANCHETTI, Maria Inês. Oswaldo Cruz: tudo pela saúde. Superinteressante. São Paulo, Abril Cultural, mar 1991.
(Publicado no Boletim AECX Notícias de Outubro de 1996)
(Publicado no Boletim GEAE Número 452 de 25 de março de 2003)
Jáder Sampaio