Atuação do Princípio Inteligente não Começa nos Minerais
Perguntaram-me se a atuação do princípio inteligente começava a partir dos
minerais. Respondi: não. Aos amigos leitores do JE, ante o debate que se abriu
em sua edição de agosto/99, com a mesma pergunta, digo, antes de respondê-la que
é mister lembrar as características dos seres vivos.
Já há séculos, distribuíram tudo quanto existe na Terra em três reinos:
mineral, vegetal e animal. Tentou a vaidade humana criar para o homem um quarto
reino – seria o reino hominal, o que não se justifica, pois o homem está
enquadrado no reino animal.
SERES BRUTOS E SERES VIVOS – Os vegetais e os animais, dadas as
qualidades que os aproximam, podem ser agrupados com o rótulo de seres
organizados. Para os cientistas, existe uma barreira intransponível entre os
seres brutos (inorgânicos) e os seres vivos, pois as propriedades peculiares à
vida só se encontram nos animais e vegetais.
Este é um ponto em que o Espiritismo está inteiramente de acordo com as
ciências biológicas. O Espiritismo ensina que a matéria precisa ser impregnada
pelo fluido vital para que possa ser utilizada pelo espírito (nos seres
inferiores) costuma-se chamar de “princípio espiritual”.
Gabriel Delanne, em seu livro A Evolução Anímica, explica a diferenciação
entre seres brutos e vivos com uma clareza meridiana. Mas em que qualidade
reside a diferença entre eles? Podemos responder que não há uma qualidade que,
sozinha, permita distinguir os minerais dos seres vivos, mas um conjunto de
caracteres o permite: forma, propriedades físico-químicas, metabolismo,
irritabilidade e evolução.
a) FORMA: Geralmente os seres brutos não têm forma própria, ao passo
que os vivos possuem forma específica. Por exemplo: quando falamos “areia”, não
estamos determinando forma alguma, nem quantidade; quando dizemos “mosca”,
estamos nos referindo a um ser que tem forma e tamanho certos. Se a areia
tivesse um principio inteligente ou espiritual, ele corresponderia a um grão de
areia ou a toda a areia do litoral?
b) PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS: Os mineiras apresentam composição
química simples, sendo as moléculas formadas de poucos átomos, ao passo que a
substância viva é complexa. Suas moléculas possuem milhares de átomos, como o
caso da hemoglobina e das proteínas em geral. A composição dos seres brutos,
além de simples, é estável, enquanto que a instabilidade caracteriza os vivos,
pois a matéria organizada está em constante renovação.
Mas não é só. Para haver vida, é preciso haver protoplasma, componente das
células, formado principalmente por proteínas. Na Terra, só pôde surgir a vida
no momento em que, na atmosfera, por meio das descargas elétricas, uniram-se
metano, amônia, água e hidrogênio, formando-se os primeiros aminoácidos
(Experiências de Urey e Miller). Estes se combinaram, formando proteínas, as
quais se aglomeraram nos coacervados e estes originaram células (Oparim,
cientista russo). Todas as células têm cromossomos e ADN, que não existem nos
minerais.
c) IRRITABILIDADE: Frente aos estímulos do meio exterior, os seres
vivos reagem, por meio de movimentos, produção de secreções, reações agressivas
ou tantas outras. Os minerais não têm irritabilidade: podemos bater numa pedra,
aquecê-la, dar choques elétricos, que não teremos resposta alguma.
d) METABOLISMO: O ser vivo retira do meio ambiente os alimentos de que
necessita, incorporando-os ao seu organismo (anabolismo). No desgaste vital,
decompõem-se substâncias do seu corpo, produzindo-se resíduos, que são
eliminados (catabolismo). A glicose é queimada, produzindo energia, gás
carbônico e água. Os minerais não têm metabolismo. Uma pedra do pico do Jaraguá,
lá está, do mesmo jeito, há muitos milhões de anos.
e) EVOLUÇÃO: Todo ser vivo nasce, cresce, vive, reproduz-se e morre.
Os minerais não apresentam esse ciclo vital: eles não nascem e nem morrem – sua
duração é ilimitada. Imaginemos, por um desvario da imaginação, que um bloco de
granito tivesse um princípio espiritual. Coitado dele – ficaria preso, imutável,
sem evoluir, durante muitos milhões de anos.
Imagine mais, se cada átomo ou partícula atômica componente do bloco tivessem
também um agente estruturador, como se diz atualmente, a comandar-lhe o
equilíbrio intimo – coitado deles.
Uma das leis que o Espiritismo prega é a sublime lei da Evolução: todos os
seres evoluem permanentemente, desde a ameba até o homem; todos eles, através de
múltiplas vivências no mundo físico, estão se aperfeiçoando, estão aprendendo,
estão plasmando corpos cada vez mais perfeitos, enquanto o espírito vai
progredindo sempre. A evolução da forma é concomitante com a evolução do
espírito.
Delanne, em seu livro A Evolução Anímica, cap. 1, A Vida, diz: “Organização e
evolução não podem ser compreendidas só pelo jogo das leis físico-químicas. Os
materialistas, com o negarem a existência da alma, privam-se voluntariamente de
noções indispensáveis à compreensão dos fenômenos vitais do ser animado; e os
filósofos espiritualistas por sua vez, empregando o senso intimo como
instrumento único de investigação, não conheceram a verdadeira natureza da alma;
de sorte que, até agora não lhes foi possível conciliar numa explicação comum,
os fenômenos físicos e os mentais”.
Continua Delanne: “No mundo inorgânico, tudo é cego, passivo, fatal; jamais
se verifica progresso; não há mais que mudanças de estados, que em nada
modificam a natureza íntima da substância”.
AS FRONTEIRAS DA VIDA – Embora sejam tão evidentes essas diferenças
entre os seres brutos e os seres vivos, podem surgir certas dúvidas. Quantas
vezes já foram a nós trazidas estas objeções: e os cristais, que têm formas
próprias, serão vivos? E os vírus?
Realmente, os cristais têm formas características: as suas moléculas se
agregam formando cubos, pirâmides de bases hexagonais ou octogonais, e assim por
diante. Porém aqui a única semelhança é a forma, mas esta é conseqüência apenas
de leis físicas de atração, que levam as moléculas do cristal a se agruparem
formando figuras geométricas. Os cristais não têm nenhuma das outras qualidades
dos seres vivos: são formados geralmente de moléculas pequenas; não nascem, nem
crescem, nem morrem, permanecendo indefinidamente, até que um agente externo
dissolva as moléculas no líquido que os abriga. Não reagem aos estímulos
externos, não têm metabolismo e não evoluem.
Os fogos de artifício traçam no céu desenhos interessantes, de variadas cores
e tamanhos. Vamos dizer que têm vida porque plasmaram figuras?
Quanto aos vírus, o problema já é mais difícil. Vejamos um resumo do que nos
ensina Luc Montagner, um dos maiores virologistas do mundo, que conseguiu
identificar o vírus da AIDS (Vírus e Homens, Luc Montagner. Tradução de Maria
Luiza Borges – Jorge Zahar Editor -1995). Diz ele: “No fim do século XIX, quando
a origem bacteriana das doenças infecciosas foi reconhecida, o termo vírus ou
vírus filtrantes passou a ser aplicado a agentes transmissíveis, que são
invisíveis ao microscópio e passam através dos filtros de porcelana, que retêm
as bactérias. Foi assim que se demonstrou a origem viral de doenças que afetam
plantas, como o mosaico do tabaco, e outras responsáveis por doenças animais e
humanas, como a gripe, a poliomielite, a varíola etc.. A invenção do microscópio
eletrônico permitiu observá-los diretamente”.
Continua Montagner: “Os vírus são seres vivos? Não exatamente, porque só
existem no interior das células de que são parasitas. O programa genético está
inscrito na banda magnética formada pelo ARN ou pelo ADN. Ele é centenas de
milhares de vezes mais curto que aquele que contém o programa genético da
célula. Para poder sobreviver no exterior da célula, o vírus está encerrado numa
casca de proteínas, a qual por vezes está cercada por um invólucro de lipídios”.
Penetrando célula, o vírus começa a se reproduzir, usando o material da
própria célula. Enzimas especificas produzem milhares de cópias do ADN, cujo
mecanismo não citaremos, por desnecessário. Todas elas são mensagens que dirigem
a síntese das proteínas virais. Formam-se nossos vírus, que saem das células,
indo infectar outras.
Estudando esses fatos, os biologistas e infectologistas ficaram na dúvida se
poderiam ou não considerar os vírus como seres vivos. Primeiro, porque só
conseguem viver dentro de células, reproduzindo-se às custas do material destas.
Segundo porque não têm as demais características dos seres vivos.
A CODIFICAÇÃO E OS NEGOCODIFICADORES – Kardec, em O Livro dos
Espíritos, livro I, cap. IV, Principio Vital, comentando a questão 71, explica:
“Podemos fazer a seguinte distinção: 1o) os seres inanimados, formados somente
de matéria, sem vitalidade, nem inteligência: são os corpos brutos; 2o) os seres
animados não pensantes, formados de matéria e dotados de vitalidade, mas
desprovidos de inteligência; 3o) os seres animados pensantes, formados de
matéria, dotados de vitalidade e tendo ainda um principio inteligente que lhes
dá a faculdade de pensar”.
Na resposta à questão 136-a, os Espíritos disseram que “a vida orgânica pode
animar um corpo sem alma, mas a alma não pode habitar um corpo sem vida
orgânica”. Portanto, o principio espiritual não pode habitar um mineral.
Como introdução ao estudo do Princípio Vital, a partir da questão 60, Kardec
escreve que “os seres orgânicos são os que trazem em si mesmos uma fonte de
atividade intima, que lhes da a vida: nascem, crescem, reproduzem-se e morrem.
Compreendem os animais e as plantas. Os seres inorgânicos são os que não possuem
vitalidade nem movimentos próprios, sendo formados apenas pela agregação da
matéria: os minerais, a água, o ar etc…”
Apesar de Kardec e Delanne ensinarem, de maneira tão peremptória, que o
principio espiritual não habita o mineral, por este não lhe oferecer as
condições de utilização ou de agitabilidade… idéias orientais, infiltradas no
movimento espírita, vêm lançando a confusão neste terreno.
Dizem, por exemplo, que tudo no Universo tem vida, desde o átomo até as
estrelas; que em tudo há a manifestação divina, através de um princípio
espiritual, que impregna toda a matéria. Não, não e não. O átomo, a molécula, os
minerais, a água, o ar, estão simplesmente sujeitos à leis físicas, não às leis
do Espírito. Não queiramos ver nas leis de tração, que regem o Universo do átomo
às estrelas, qualquer coisa de espiritual.
Também nas afinidades químicas, como a que faz os átomos de cloro buscarem
uma combinação com os de sódio, formando o cloreto de sódio, ou sal de cozinha.
Nessa combinação não há amor ou afinidade psíquica, como dizem os sonhadores,
mas simplesmente afinidade química.
Mas não são só os orientais, nas suas meditações nos píncaros do Himalaia,
que dizem isto. Infelizmente, pensadores do mais alto gabarito estão querendo
fazer uma simbiose entre idéias desses religiosos místicos em êxtase com a
física quântica. Tais pensadores lembra a atuação de um “agente estruturador
externo ao Universo material, para que se forme a mais elementar das
subpartículas atômicas”, dando origem ao átomo. Por exemplo, diz Carlos de Brito
Imbassahy, em A Bioenergia no Campo do Espírito, item 2.1, que experiências no
acelerador do LEP mostravam “que algo comandava as ações dessas partículas, como
se tivessem uma alma ou espírito próprio, evidentemente distinto do que se
considera alma animal”.
Haverá, então, dois dirigentes da estruturação material, um que agiria nos
átomos e outro nos seres vivos? Não, o assunto já é complexo demais; não vamos
complicar mais ainda. Essas são elucubrações teóricas de mentes cultas e
avançadas, mas inteiramente destoantes dos ensinos da Codificação. Mineral não
tem vida, não abriga nenhum princípio espiritual.
A matéria, como ensina Kardec, é apenas substância usada pelos Espíritos para
sua trajetória no mundo terreno. Não evolui, não tem individualidade ou
personalidade. Não queiramos inovar, em terreno tão escorregadio. ”
“7o. JORNAL ESPÍRITA, SETEMBRO DE 1999 – EM DEBATE”