A imprensa espírita demonstra certa aversão ao discurso das reuniões evangélicas,
sob o argumento de que os palestrantes querem desentortar o caráter das pessoas
com a violência de um ferreiro dando forma ao metal. Seria uma agressão ao livre-arbítrio
porque não aceitam que os homens sejam como querem ser.
Mas se eles pretendem continuar como são, o que vão fazer no Centro Espírita,
perguntamos ? Os espíritas, que censuramos a conduta de irmãos de outras doutrinas,
porque mantêm o fiel na ignorância evitando polemizar sobre dogmas que não podem
explicar, não podemos fazer o mesmo!
Se considerarmos aqueles que vão ao centro só para resolver problemas pessoais,
sem cogitar da própria modificação, não temos de perder tempo com estes. Façamos
como fizermos e digamos o que quisermos, para estes será sempre a mesma coisa. Não
estão interessados nas orientações, mas nas vantagens que o centro possa oferecer.
Querem desenrolar a vida, melhorar a saúde, harmonizar o lar ou casar a filha. Pretendem
receber sem nada oferecer. É como quem vai ao hospital em busca do tratamento. Não
pretende ser sócio nem trabalhar lá.
Para falar da eficiência de um Centro Espírita, o analista não pode ser apenas
acadêmico. É preciso conhecer as entranhas do agrupamento e acompanhar seus participantes,
para aferir as modificações experimentadas, que são sempre proporcionais às
orientações que ali são oferecidas.
Poderíamos relatar, para citar vivência pessoal, vários casos de companheiros
que chegaram ao centro e depois de algum tempo confessaram haver cogitado de deixar
o grupo porque determinado dirigente era rigoroso. Exigente quanto ao silêncio,
ao horário, ao comportamento, ao relacionamento entre todos, trabalhadores e assistidos,
à assiduidade, aos estudos, e até quanto ao simples manuseio do livro retirado da
biblioteca.
Parece absurdo, mas não sabemos sequer folhear um livro com a delicadeza e o
respeito que merece, porque é uma fonte onde se bebe conhecimento. Depois
de lida uma obra, é comum haver páginas soltas, rabiscadas, cantos dobrados, quando
seria mais fácil usar um marcador e fazer anotações à parte. Quanto maior for a
sua vida útil, a mais pessoas poderá servir.
Com o passar do tempo, esses descontentes mudaram de opinião. E a mesma confissão
que fizeram quanto à repulsa que sentiam pela forma como o centro era dirigido,
usam hoje para agradecer e relatar o quanto aprenderam com o rigor da direção. E
esse progresso não ficou restrito às quatro paredes da Casa Espírita porque se refletiu
na vida pessoal, familiar e profissional dessas criaturas. Houve uma transformação
dessas pessoas, a partir de suas raízes. Não foi superficial, um simples envernizado.
No Centro Espírita, temos de dizer às pessoas que elas precisam melhorar no próprio
interesse delas. Temos de insistir que o mundo material, necessário no nosso atual
estágio, não pode ser o nosso patrão, porque se destina ao desenvolvimento do Espírito.
Cansamo-nos em demasia por certos valores de uso temporário e não construímos o
definitivo. Tudo pelo corpo, nada pela alma. Temos de informar e, mais que
isso, temos de mostrar que não apenas pensamos, mas vivemos. Ninguém convencerá
ninguém com uma preleção sobre vícios, se ao final da reunião, ainda na porta do
centro, resolver pitar o seu cigarrinho.
Não se pode ser hipócrita para encher a casa, para atender à vaidade do dirigente.
O desenvolvimento do Espiritismo não deve ser produto de mentiras, falsidades ou
tolerâncias levianas. Não temos na Doutrina Espírita uma meta material, mas um objetivo
espiritual.
Se não pudermos ter uma casa grande, que seja pequena; se não puder ser própria,
que seja alugada; se não for possível atender 100 pessoas, que sejam 10, mas sem
trair os princípios que abraçamos. Se fizermos o inverso, nada construiremos. E
mesmo que realizemos grandes empreendimentos materiais, nada edificaremos na obra
espiritual.
É dever do espírita que divulga a Doutrina combater suas más inclinações e estimular
os outros a que façam o mesmo.
Quem entender que o discurso é rigoroso e cansativo, paciência. Procure um lugar
onde lhe digam coisas agradáveis e onde não tenha de assumir compromissos.
O Espiritismo não tem de se adaptar às pessoas sob pena de cair no lugar
comum e ser mais uma religião desacreditada, mística e de fachada; e caso resolva
ceder, já não será mais o Consolador prometido por Jesus.
(Publicado no Jornal A Voz do Espírito – Edição 88: Novembro-Dezembro de 1997)