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Espiritismo ou Kardecismo?

De um tempo para cá um estranho fenômeno ocorre em nosso meio: pessoas
respeitáveis aceitam a Doutrina Espírita, entusiasmam-se com seus postulados e
se beneficiam da consolação por Ela propiciada. No entanto, chegado o momento
das definições, afirmam-se não espíritas, mas espiritualistas ou “kardecistas”.

Quanto ao espiritualismo, a definição é incompleta, já que todas as crenças
baseadas na existência da alma são espiritualistas.

E quanto ao “kardecismo”?

As origens históricas do termo, embora não possam situar-se no tempo, são
perfeitamente caracterizadas quanto aos fatos. Ao chegarem ao Brasil, os
escravos trouxeram consigo suas crenças, seus cultos, que ali se fundiram, com o
crescimento das crenças indígenas e católicas. Esses grupos étnicos já
praticavam a mediunidade. Ora, com o aparecimento entre nós da Doutrina
Espírita, uma de cujas bases principais é exatamente o fenômeno mediúnico, foram
inevitáveis as generalizações. Tudo quanto se referisse ao intercâmbio com o
outro plano era considerado Espiritismo.

Tal equívoco ocasionou lamentáveis deturpações. Não queremos aqui discriminar
os grupos afro. Há entre eles os que, embora divergindo da Doutrina Espírita
quanto ao aspecto religioso e à prática mediúnica, lêem Allan Kardec, adotam
seus postulados filosóficos e servem ao próximo com desprendimento e abnegação.

Não se pode negar, entretanto, as deturpações a que nos referimos acima. Eram
comuns em certos setores da imprensa manchetes como: “Assassinato em um Centro
Espírita”, “Incorporado pelo Guia Fulano…”. Além disso, não são raros os
folhetos em que se lê: “Madame Fulana de tal. Vidente Espírita, soluciona todos
os problemas, resolve caso de amor e dinheiro, prevê o futuro…” etc.

Resultado: para não se embarafustarem com toda esta confusão, alguns
companheiros abrem mão do termo espírita e preferem a expressão “kardecista”.
Haverá, porém, algum fundamento para tal posição?

Em primeiro lugar, Allan Kardec sempre fez questão de assinalar que, ao
contrário de todas as doutrinas anteriores, o Espiritismo não foi fundado por
homens, mas é conseqüência das revelações trazidas pelo Plano Espiritual.

Em segundo lugar, não podemos descartar a gama de preconceitos que envolve a
substituição dos termos espírita e Espiritismo pelos termos “kardecista” e
“kardecismo”.

Não querem, estes companheiros, que suas crenças sejam confundidas com
aquelas que, para eles, são “inferiores”. Não querem ser identificados como
“feiticeiros” ou “macumbeiros”. Tal confusão, no entanto, não advém deste ou
daquele termo, mas da posição de cada um perante a vida e diante de si mesmo.

Ao invés de simplificarmos as coisas dando à Doutrina Espírita nomes que ela
não possui, chamando-a “kardecismo”, “mesa branca”, “Espiritismo Científico”,
etc., arquemos com os incômodos das explicações; e, definindo-nos claramente
como espíritas, esclareçamos simplesmente os que nos abordem sobre o que é, e o
que não é Espiritismo.

(Revista Espírita Harmonia – nº 34 – agosto de 1997)

(Jornal Mundo Espírita de Outubro de 1997)