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O que se oferta às Crianças…

Marlene Fagundes Carvalho Gonçalves

de Ribeirão Preto, SP

“Comovo-me ao contemplar esses olhinhos espremidos de curiosidade e atenção, sequiosos de uma semeadura que povo e a mente de ideais promissores, de inspirações grandiosas… e quão criminosos não seremos se, ao invés do pão espiritual, apenas lhes lançarmos açucaradas guloseimas ou, ainda pior, o veneno no disfarçado em prato apetitoso aos olhos ingênuos!”

Muito me chamou a atenção a psicografia assinada por Cecília Meirelles, apêndice do livro A Educação segundo o Espiritismo, de Dora Incontri, editada pela FEESP. Tal texto ressalta a importância da escolha dos textos que se oferecem às crianças, e da responsabilidade do adulto no sentido de guiá-las através das leituras, propiciando um melhor aproveitamento da sua reencarnação. A autora diz o seguinte:

“Quem se habilita a ofertar à criança uma página, um verso, um dizer – que o faça com a unção de quem deposita flores no altar de uma alma…

Quem se atreve a modelar os sonhos das novas gerações e projetar imagens que criarão atos e impulsos, pensamentos e outras criações, que o faça com a responsabilidade absoluta da Beleza e do Bem…

Nada de oferecer um restolho de inspiração, o que sobrou nas prateleiras de idéias rejeitadas para o mundo dos adultos e que sob uma embalagem graciosa se dê empacotado para a pequena alma infantil – que pode encerrar uma grandeza oculta aos olhos da carne!

É preciso doar à criança o que de melhor nos escorrer do espírito, em estado de graça e simplicidade! Algo que possa servir para a vida toda e até mais além, eternidade afora…

A facilidade fútil com que os adultos costumam, sobretudo nesses tempos banais, confeccionar historietas e livretos, poeminhas e toda a multiplicidade de imagens televisivas, é um desrespeito à inteligência que torna ao mundo, na expectativa. de arrojados progressos espirituais!

Quanto cuidado é preciso para se extrair algo do escrínio da inspiração, que seja digno da pureza infantil e ao mesmo tempo substancial para o Espírito eterno, que habita o corpinho tenro!

Comovo-me ao contemplar esses olhinhos espremidos de curiosidade e atenção, sequiosos de uma semeadura que povoe a mente de ideais promissores, de inspirações grandiosas… e quão criminosos não seremos se, ao invés do pão espiritual, apenas lhes lançarmos açucaradas guloseimas ou, ainda pior, o veneno no disfarçado em prato apetitoso aos olhos ingênuos!

A palavra semeada numa alma de criança pode frutificar amanhãs radiosos, mas também pode se tornar um espinho indesejável, de que muitas vezes ela não conseguirá se livrar. Nunca serão excessivos os cuidados que tomarmos com o alimento de arte que possamos lhes oferecer.

Quando escritores se debruçarem sobre a página em branco, para respingar idéias e metáforas para as crianças, que se elevem para o infinito, pois é de infinito que devemos fecundar o futuro. Quando pais e mestres buscarem as páginas já escritas, que escolham as que mais possam refletir idéias transcendentes e não as que se arrastam na miséria apenas do cotidiano.

Não digo, com isso, que a literatura infantil deve ser preenchida de metafísica pedante e indigesta. Ao invés, é na simplicidade que moram as grandes idéias do Bem e do Amor e é na vida transpassada para a beleza das palavras que habitam os exemplos dignos de serem conhecidos e as aventuras mais excitantes da evolução espiritual.

Que se transportem as jornadas interessantes a terras longínquas ou a outros planetas em metáforas da grande aventura que é o progresso do Espírito em direção à luz das estrelas! Que se saiba traduzir o Bem e a Verdade sem o moralismo maçante das igrejas, mas com a poesia que o universo mesmo oferece aos olhos atentos e sensíveis do verdadeiro artesão das palavras!

Há tantas fontes de inspiração inexploradas, há tantas belas palavras ainda não suficientemente bem arranjadas para carregarem no bojo mensagens eternas, que quase me sinto tentada a repetir meu ofício na próxima vida terrestre, e quiçá alcançar maior elevação do que me foi dado realizar, para escrever novamente a esses seres que adoro. Esses seres que, enquanto crianças, manifestam o que de melhor há na humanidade para ser amado.

Enquanto isso, vou inspirando aqui e ali, anônima ou explicitamente, aqueles que se afinam com esses propósitos, mas esperando sempre que os adultos finalmente se convençam dos cuidados extremos que devem tomar no cultivo da alma infantil.”

Cecília Meirelles, 31/7/92.

E-mail da autora do artigo: verdeluz.marlene@bol.com.br

(Jornal Verdade e Luz Nº 182 de Março de 2001)