Amilcar Del Chiaro
Meu filho fez 15 anos. Idade linda! É o momento em que o jovenzinho começa a sentir-se homem, ao mesmo tempo em que conserva a ternura da criança. Certamente não há nada demais, fazer 15 anos. É a cronologia da vida a caminhar. Nesta idade muitos jovens trabalham e os estudos seguem o seu ritmo normal. Os meninos, melhor dizendo, os jovenzinhos, jogam futebol, freqüentam bailinhos, ouvem discos, ensaiam os primeiros namorinhos.
Mas, com meu filho, é diferente. Ele é classificado como excepcional; ele não conversa direito e as suas reações mentais são de uma criança muito nova. Mas, meu Deus, como ele sabe amar, como ele vive com intensidade! Quando ele chora, o seu sentimento extravasa nas lágrimas abundantes; quando ele ri, o faz com toda alma. No seu mundo só penetramos quando ele permite, e com que unção o fazemos, parece-nos um território sagrado, e que, ao penetrarmos ali, somos sacrílegos.
É um mundo que não compreendemos, mas que, apesar de fechado, não tem sombras. Meu Deus, quantos sonhos… “Ah, meu filho vai estudar, vai ser alguém que eu não pude ser; meu filho vai ser atleta, vai ter namoradinhas, vai ser meu amigo. Vamos fazer longos passeios e conversar muito”. Mas não foi assim. Meu filho não pode ser alfabetizado; ele tem 15 anos e não conhece as letras; ele não vai ser importante, a não ser para mim e para os que o amam.
Ele não é atleta; ele corre desengonçado e se cansa logo; ele não tem namoradinhas, apesar de ser bonito e saber quando uma menina é bonita. Mas, passear, sim. Nós passeamos de vez em quando e falamos muitas coisas. Não, não entenda mal. Esta crônica não é um desabafo. Eu não estou decepcionado, nem triste. O que lamento é não ser aquele pai de que ele precisa, não tenho aquela paciência que deveria ter.
Às vezes eu grito, e esbravejo e na sua linguagem peculiar ele fala: “Fica bravo com Marquinho, não. Quando olho para ele, vejo que é feliz, que ama e é amado. Quando as coisas se complicam, ele entra para o seu mundo e fecha as porta. De vez em quando abre uma fresta, para ver se as coisas normalizaram. Oh, meu Deus! Pedi-te um filho e deste-me uma criatura maravilhosa; não vou dizer que ele seja um anjo, mas é alguém destinado ao seu Reino — Bem aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos Céus! Eu sou espírita, sou reencarnacionista, e sei que tudo tem uma razão de ser; do contrário seria difícil compreender que Deus é pai.
Seria mais imperfeito que os pais humanos? Deus amaria menos do que eu? Não. Deus é amor e justiça. Sabe, eu fico triste mesmo é quando vejo as crianças “normais” repeli-lo ou agredi-lo, ou quando alguém diz, como já disseram para mim: “uma criança assim precisa ser internada!” Ora, meu Deus, quem irá amá-la, então? Quem irá ouvir suas queixas, interpretar suas frases truncadas ou mal construídas? Quem irá adivinhar o significado dos nomes gozados que ele inventa para as coisas? Quem irá tranqüilizá-lo à noite, quando acorda assustado, ou tem sonhos maus? Não. Mil vezes não. O lugar do meu filho é ao meu lado. Só peço a Deus que me conceda o privilégio de cuidar dele enquanto viver. Parabéns meu filho, parabéns pelos seus 15 anos de amor e simplicidade. Guarulhos, 16 de outubro de 1980. “Do livro – Quando O Amor Fala Mais Alto