Na Revista Espírita de setembro de 1865, Allan Kardec usou o texto resumido do importante Prefácio de O Céu e o Inferno para anunciar o lançamento da primeira edição da obra.
Esse texto essencial, que viria a ser removido quatro anos depois pelos adulteradores da obra, explica a forma de construção da obra no contexto da codificação espírita, observando com rigor os princípios e critérios que lhe conferem força, especialmente no que toca ao controle universal dos ensinos dos espíritos.
Kardec apresenta sua nova obra e as outras posteriores a O Livro dos Espíritos como desdobramentos ou revelações complementares sucessivas dos ensinos dos Espíritos, que são transmitidos no momento oportuno. Destaca que nada foi inserido “que seja o produto de um sistema preconcebido ou de uma concepção pessoal”, sendo conveniente omitir os nomes dos médiuns, já que a revelação espírita não é privilégio de ninguém.
Todavia, reside no capítulo VIII original (As penas futuras segundo o Espiritismo) a parte mais importante da obra e da própria doutrina espírita, pois nele Kardec apresenta, a partir da observação e do critério da universalidade, o coroamento da questão moral no Espiritismo, com uma exposição objetiva das leis relativas ao futuro da alma, de onde emerge a autonomia intelecto-moral do espírito.
Por meio dessas leis e dos conceitos ressignificados por Kardec, compreende-se a trajetória da alma, que, de acordo com as escolhas, que são de sua inteira responsabilidade, pode passar pelos processos de sofrimento, arrependimento, expiação e reparação, ao mesmo tempo que experimenta aumento gradual de felicidade, em razão de seu aperfeiçoamento.
De acordo com a análise comparativa dos textos das duas edições de O Céu e o Inferno, foi o capítulo VIII original o principal alvo dos adulteradores, que desfiguraram completamente o texto para retirar as ideias de autonomia moral para inserir os preceitos heterônomos dos dogmas.